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STJ cria figura do “inventariante digital” para gerir dados de falecidos

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ decidiu, de forma inédita, pela criação da figura do “inventariante digital” em processos de inventário que envolvem bens armazenados em dispositivos eletrônicos de pessoas falecidas. A decisão foi tomada no julgamento do Recurso Especial 2.124.424, envolvendo a morte de seis membros de uma mesma família em acidente aéreo em São Paulo, em 2016. Os herdeiros buscavam acesso a três tablets pertencentes às vítimas para identificar eventuais bens digitais.

O “inventariante digital” terá a função de atuar como perito, acessando computadores, tablets e celulares com a finalidade exclusiva de identificar bens de valor econômico ou afetivo, sem expor informações íntimas ou protegidas pelo direito da personalidade.

Segundo a relatora, ministra Nancy Andrighi, a medida busca evitar que herdeiros, magistrados ou empresas de tecnologia tenham acesso irrestrito a dados altamente pessoais, como registros privados e comunicações protegidas por senha. “O inventariante digital apenas auxilia o juiz, com conhecimento técnico específico, a identificar quais bens podem ser transmitidos e quais devem permanecer sob sigilo”, destacou.

A relatora foi acompanhada pelos ministros Humberto Martins, Moura Ribeiro e Daniela Teixeira. Ficou vencido o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, para quem caberia ao próprio Judiciário autorizar o acesso às informações, sem necessidade da criação dessa figura intermediária.

A decisão é considerada um marco por inaugurar no Brasil a regulamentação judicial sobre a chamada herança digital, campo ainda sem disciplina legal específica.

REsp 2.124.424

Bens digitais

Em agosto deste ano, quando o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva pediu vista do processo, a relatora Nancy Andrighi já havia defendido a criação de um incidente processual de identificação de bens digitais.

Na ocasião, ela ressaltou que a abertura indiscriminada de dispositivos poderia expor informações íntimas e intransmissíveis. Sua proposta incluía a nomeação de um “inventariante digital” como auxiliar da Justiça, com dever de confidencialidade e responsabilidade civil e criminal em caso de violação.

O advogado e professor Marcos Ehrhardt Jr., vice-presidente da Comissão Nacional de Tecnologia do IBDFAM, avaliou que a futura decisão do STJ teria impacto significativo sobre o tratamento da herança digital no Brasil. “O papel do STJ é unificar a aplicação do Direito federal infraconstitucional em nosso país. Logo, um precedente que apresente uma solução para questões que ainda carecem de regulamentação contribui para conferir maior visibilidade ao assunto, fomentar o debate acadêmico e profissional sobre o tema e ainda ajuda a conferir um pouco mais de previsibilidade para futuras decisões judiciais relacionadas ao assunto”, afirmou na época.

Fonte: Site IBDFAM

Empresa é condenada por falha no repasse de pensão alimentícia a filhas de funcionário

Uma empresa foi condenada ao pagamento de indenização por danos morais após descumprir ordem judicial que determinava o desconto de pensão alimentícia diretamente na folha de pagamento de um de seus funcionários, pai de duas crianças. A decisão é da 5ª Vara Cível da Comarca de Santo André, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – TJSP.

A ação de  indenização por danos morais  foi ajuizada pelas filhas, representadas pela genitora, contra a empresa na qual o homem trabalha. O processo considerou o atraso reiterado no repasse de pensão alimentícia, que a empresa, na qualidade de empregadora do devedor de alimentos, deveria descontar em folha e transferir à conta indicada.

Conforme as autoras, a empresa cometeu sucessivos erros na efetivação da transferência, inclusive efetuando depósitos em conta incorreta, o que acarretou prejuízos às crianças, como a inadimplência de mensalidades escolares.

Ao avaliar o caso, a juíza reconheceu o descumprimento da obrigação legal da empresa de efetuar corretamente o repasse da pensão alimentícia. Segundo a magistrada, “trata-se de verba destinada à manutenção e ao sustento da família, de modo que os entraves observados por certo causaram danos passíveis de indenização”.

O valor da indenização foi fixado em R$ 5 mil para cada autora. Para o advogado Bruno Campos de Freitas, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, que atuou no caso, o valor “se mostra proporcional à gravidade da conduta e às consequências práticas enfrentadas”.

A decisão, segundo ele, reconhece a responsabilidade direta da empregadora que, ao ser incumbida judicialmente de fazer o repasse, falhou reiteradamente, mesmo após ser notificada formalmente sobre os dados corretos. “O reconhecimento de que terceiros responsáveis pela operacionalização dos pagamentos também podem responder por danos morais amplia a compreensão da responsabilidade civil nesse tipo de relação.”

O advogado acredita que a decisão pode servir como importante precedente para casos em que empresas ou instituições são encarregadas de cumprir determinações judiciais, como descontos e repasses, e agem com negligência.

“A decisão reforça o entendimento de que a obrigação judicial deve ser cumprida com diligência, sob pena de responsabilização por eventuais prejuízos, inclusive morais, especialmente quando envolvem verbas de natureza alimentar e menores de idade. Assim, tende a incentivar maior cuidado por parte dos empregadores e administradores ao executarem ordens judiciais”, conclui.

Fonte: Site IBDFAM

STJ mantém decisão que condenou pai a pagar indenização de R$ 150 mil por abandono afetivo

O Superior Tribunal de Justiça – STJ confirmou a condenação de um homem a pagar R$ 150 mil de indenização à filha por danos morais causados por abandono afetivo, após romper relações com ela desde o nascimento.

De acordo com o processo, na infância, a filha foi criada pela mãe, que morreu quando ela tinha 5 anos, quando passou a viver sob os cuidados dos avós maternos. Com a morte do avô e da avó, ela tentou se aproximar do pai, que a bloqueou nas redes sociais.

A sentença que fixou a indenização por abandono afetivo foi dada em segunda instância, pelo Tribunal de Justiça de Goiás – TJGO. A decisão destacou que a ausência intencional do pai durante toda a infância e juventude da filha, associada ao descumprimento de suas obrigações legais e materiais, configurou dano moral.

Segundo o acórdão, o dever de cuidado dos genitores é uma obrigação legal prevista na Constituição, no Código Civil e no Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, sendo independente de qualquer vínculo emocional.

O caso chegou ao Superior Tribunal de Justiça – STJ, que negou provimento ao recurso especial interposto pelo genitor por não atender aos requisitos de admissibilidade. Com isso, manteve-se a condenação fixada pelo Tribunal estadual goiano.

O processo tramitou em segredo de Justiça e a decisão transitou em julgado, não sendo mais passível de recurso.

Precedente 

O caso contou com atuação do advogado Charles Christian Alves Bicca, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM. Segundo ele, esta é a segunda maior indenização por abandono afetivo já reconhecida no Brasil e fica atrás apenas de um precedente do próprio STJ, de 2012, no valor de R$ 200 mil (REsp 1.159.242), citado pelo relator no TJGO como referência.

“A fundamentação destacou o artigo 229 da Constituição Federal, que impõe aos pais o dever de assistir, criar e educar os filhos menores. O descumprimento dessas obrigações configura ato ilícito indenizável. O desembargador relator também comparou a situação com casos de indenização por morte de pais e mães, afirmando que aquele que se esquiva totalmente da vida do filho também deve ser responsabilizado”, comenta.

O advogado ressalta que, apesar de inúmeras tentativas de aproximação, inclusive pelas redes sociais, o homem bloqueou qualquer contato e deixou claro que não queria vínculo com a filha.

“Em contrapartida, a jovem descobriu que uma irmã recebia tratamento totalmente distinto, com acesso a patrimônio bilionário, viagens internacionais e luxo, enquanto ela vivia em situação de pobreza”, conta.

No processo, foram anexados laudos técnicos que comprovaram sequelas emocionais graves decorrentes do abandono, como baixa autoestima, depressão, autorrejeição e traumas permanentes.

Patamar indenizatório

Charles Bicca acrescenta que a decisão tem impacto relevante porque retoma o patamar indenizatório de 2012, após mais de uma década, em que “condenações por abandono afetivo no Brasil raramente ultrapassam R$ 30 mil a R$ 40 mil”.

“Não se trata de um dano moral simples, que passa com o tempo. É um dano a um projeto de vida, permanente, que acompanha a vítima por toda a existência. O abandono é uma morte em vida. Por isso, precisa ser punido com máximo rigor”, afirma.

O advogado avalia ainda que a decisão tem caráter pedagógico e simbólico. “Nenhuma criança ou adolescente deve crescer sem o amparo mínimo de seus pais”, conclui.

Fonte: Site IBDFAM

Desigualdade de condições leva à fixação de alimentos diferentes para filhos de idosa de 94 anos

A 1ª Vara da Família e Sucessões da Comarca de São Paulo, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – TJSP, determinou que três dos quatro filhos de uma idosa de 94 anos contribuam proporcionalmente com pensão alimentícia em favor da mãe. A filha, que já presta cuidados diários à idosa, foi dispensada do pagamento.

A idosa ajuizou a ação contra os quatro filhos sob o argumento de que sua renda previdenciária, de aproximadamente R$ 5.800 não era suficiente para custear despesas mensais superiores a R$ 10.000, especialmente em razão de cuidados com saúde e contratação de cuidadores.

Com base nos critérios de proporcionalidade, possibilidade e necessidade, o magistrado fixou valores distintos para cada filho: um deve pagar um salário mínimo, o outro 50% do salário mínimo, e a outra filha 30% do salário mínimo nacional. A filha que cuida da autora ficou dispensada de pagar pensão em dinheiro, pois sua contribuição ocorre in natura, por meio da assistência direta.

O advogado Igor Florence Cintra, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, atuou no caso. Para ele, é “lamentável que uma questão como essa tenha chegado ao Judiciário”. 

Segundo o advogado, o dever de amparar os pais na velhice é expressão da solidariedade familiar, princípio que inspira o artigo 229 da Constituição Federal do Brasil.

“Mais do que uma imposição legal, trata-se de um compromisso ético, que deveria nascer da gratidão e do reconhecimento pelo cuidado recebido durante a infância e a vida adulta. A judicialização revela, de certo modo, uma ruptura desse elo de cuidado intergeracional, que é essencial para a dignidade da pessoa idosa”, comenta.

Solidariedade familiar

Na visão do advogado, a decisão da Justiça de São Paulo reforça a aplicação prática do dever de solidariedade familiar, previsto no artigo 229 da Constituição Federal e nos artigos 1.694 a 1.697 do Código Civil, “garantindo a proteção da pessoa idosa em situação de vulnerabilidade”.

A relevância, segundo ele, está na forma como a decisão harmoniza dois aspectos fundamentais: “o da dignidade da pessoa idosa, pois mesmo com renda própria, o idoso pode necessitar de complementação financeira para custear cuidados especiais; e, o da proporcionalidade entre necessidade e possibilidade, que distribui a obrigação alimentar de forma equilibrada, evitando onerar excessivamente apenas um descendente e valorizando a contribuição não financeira, como a prestação de cuidados diários”.

“A obrigação alimentar é solidária, mas não uniforme, podendo coexistir a pensão em dinheiro com o apoio pessoal prestado por uma das filhas”, explica.

Possibilidade

Igor destaca que a magistrada responsável pelo caso aplicou o critério previsto no artigo 1.694, § 1º do Código Civil, analisando criteriosamente a necessidade da mãe e as possibilidades individuais de cada filho.

De acordo com o advogado, a necessidade da alimentanda foi presumida pela idade avançada e comprovada pelos gastos com saúde e cuidadores. Quanto aos filhos, a contribuição foi definida conforme a capacidade econômica de cada um, individualmente, levando em conta renda, patrimônio e encargos familiares.

Além disso, acrescenta Igor, a filha com quem a genitora reside ficou dispensada de pagar valores, pois já cumpre sua obrigação com a assistência direta, “que também é forma de prestar alimentos”.

Ele conclui: “A sentença, portanto, é exemplo de aplicação concreta do trinômio proporcionalidade-necessidade-possibilidade, sem adotar soluções padronizadas e respeitando as peculiaridades do caso”.

Fonte: Site IBDFAM

Justiça do Rio Grande do Sul autoriza mãe a mudar de Estado e manter guarda compartilhada da filha

No Rio Grande do Sul, uma mãe obteve autorização da Justiça para levar sua filha de 6 anos ao mudar-se para Goiás. Apesar de ter a guarda compartilhada da criança com o pai, o lar de referência é o materno, por isso a 2ª Vara Cível da Comarca de Farroupilha acolheu o pedido de transferência.

Segundo a decisão, a mãe pediu a mudança para retornar à sua cidade natal, onde mantém laços familiares, após se divorciar do pai da criança e ficar desempregada. O pai se opôs, alegando a importância de preservar a rotina da filha, diagnosticada com Transtorno do Espectro Autista – TEA.

Ao analisar o caso, a Justiça gaúcha concluiu que a mudança de residência da mãe não prejudica a guarda compartilhada, já que o lar materno continua sendo a referência para a criança. Além disso, o juízo destacou que o pai, por exercer atividade em regime de home office, teria flexibilidade para reorganizar sua rotina e manter a convivência com a filha.

O juiz seguiu parecer do Ministério Público – MP, que se manifestou favorável à mudança e ressaltou que a criança mantém vínculos familiares em Goiás, onde moram os avós maternos. O MP também afirmou que os tratamentos médicos poderão ser readequados na nova residência e ressaltou a importância de cuidados para assegurar a adaptação escolar e clínica da menina.

Consequências

O caso contou com atuação da advogada Karla Felix, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM. Segundo ela, é comum que mães, com a guarda compartilhada de filhos e filhas, se mudem de cidade ou Estado sem autorização judicial, o que pode acarretar consequências sérias.

“Quando não há consenso entre os genitores, a mudança depende de autorização do Judiciário, sob pena de caracterizar violação de direitos ou até mesmo alienação parental”, explica. Ela alerta que, quando a alienação parental é reconhecida judicialmente, a guarda da criança pode ser transferida para o genitor alienado.

Por isso, para a advogada, a mãe do caso analisado adotou o caminho correto. “Ela recorreu à via legal e conseguiu uma decisão que garante tranquilidade, sem riscos jurídicos para si e para a guarda da filha”, diz.

A especialista destaca que a Justiça gaúcha analisou toda a situação e autorizou liminarmente que mãe e filha pudessem recomeçar a vida em um local próximo à rede de apoio familiar materna, com condições de estrutura e tratamento para a filha. “O melhor interesse da criança foi devidamente priorizado, pois uma decisão contrária beneficiaria apenas o interesse do genitor”, afirma.

Direito de convivência

Karla Felix ressalta que a decisão preserva a guarda compartilhada e o direito de convivência do pai, já que ele exerce trabalho remoto que permite flexibilidade para manter contato com a filha.

“A medida não rompe os laços com nenhum dos genitores e coloca em primeiro plano a necessidade de cuidado e proteção integral da criança”, pontua.

A advogada acrescenta que a decisão mostra que a guarda compartilhada não pode ser usada para impedir que a mãe retorne à cidade natal e que a criança mantenha convívio com os familiares maternos, desde que sejam adotadas medidas para minimizar eventuais impactos.

“É uma tendência do Judiciário de valorizar a guarda compartilhada como regra, sem que ela seja usada como obstáculo para reorganizações legítimas da vida dos genitores. Sendo assim, o melhor interesse da criança tem sido interpretado de forma ampla, considerando vínculos afetivos, acesso à saúde, educação e rede de apoio”, analisa.

Fonte: site IBDFAM

Mulher que se dedicou exclusivamente à família por 35 anos deve receber pensão permanente

No Rio de Janeiro, uma mulher que se dedicou exclusivamente à família na constância de uma união estável de 35 anos deverá receber pensão permanente do ex-companheiro. A 1ª Vara de Família da Comarca de Jacarepaguá converteu alimentos provisórios em definitivos e determinou o pagamento de 30% dos rendimentos brutos.

Conforme o processo, o casal manteve união estável por aproximadamente 35 anos. Neste período, tiveram três filhos e a autora se dedicou integralmente ao cuidado deles e do lar.

Na ação, a mulher, com mais de 60 anos, alegou ter renunciado a sua formação profissional e de qualquer atividade remunerada, enquanto o réu assumia sozinho o sustento da família.

Ao avaliar o caso, a juíza considerou que a situação financeira da autora dificulta sua inserção no mercado de trabalho. Além disso, conforme a magistrada, mesmo que venha a obter emprego, a renda provavelmente não seria suficiente para a subsistência digna, diante do tempo que ficou afastada da atividade profissional e da ausência de formação superior.

Ainda conforme a juíza, o réu, funcionário público aposentado, possui renda comprovada, o que possibilita o pagamento da pensão sem comprometer suas necessidades básicas.

Deste modo, e com base no princípio do binômio necessidade-possibilidade, a magistrada converteu os alimentos provisórios em definitivos, fixando o valor em 30% dos rendimentos brutos do réu, incluindo 13º salário, férias, abonos, verbas rescisórias e gratificações, a serem depositados diretamente em conta bancária da autora.

Necessidade

A advogada Mariana Diaz, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, que atuou no caso, destaca: “O fim da relação não rompe totalmente os laços de responsabilidade entre os ex-companheiros quando há dependência econômica consolidada”.

“Ao longo de uma relação tão prolongada, muitas vezes uma das partes se dedica mais à casa, à família, enquanto a outra se consolida no mercado de trabalho. Quando há desigualdade, como neste caso, no qual sempre existiu uma dependência econômica da ex-companheira, a lei e os Tribunais entendem justo garantir pensão para a parte mais vulnerável e hipossuficiente da relação”, comenta a advogada.

Segundo Mariana, o Judiciário tem interpretado o binômio com maior sensibilidade social em uniões estáveis longas. “A necessidade não se resume à sobrevivência mínima, mas também à preservação da dignidade de quem dedicou a vida ao casamento/união estável, equilibrada pela real possibilidade do ex-companheiro/ex cônjuge, de maneira mais humana e levando em conta o contexto da vida em comum desse casal.”

Fonte: Site IBDFAM

STJ reconhece união estável de forma incidental para viabilizar adoção póstuma

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ autorizou um pedido de adoção póstuma e reconheceu, exclusivamente para fins do processo, a união estável dos adotantes, que viveram juntos por mais de 30 anos. O caso trata de uma criança entregue voluntariamente pela mãe biológica.

Segundo informações do STJ, ao entrar na Justiça com o pedido de adoção e destituição do poder familiar, o casal contou que a criança foi entregue a eles quando ainda era bebê. O juiz negou o pedido por considerar que a mãe biológica se arrependeu e que houve tentativa de burlar o cadastro de adoção. Mesmo assim, eles recorreram da decisão.

Antes do julgamento do recurso, um dos pretensos adotantes faleceu. Ao final, o Tribunal de segunda instância decretou a perda do poder familiar da genitora, que novamente teria “desistido” da criança, e deferiu o pedido de adoção ao casal.

No STJ, herdeiros do adotante falecido interpuseram recursos sustentando, entre outras questões, a falta de provas da união estável para autorizar a adoção conjunta, além do desrespeito ao cadastro nacional.

Ambiente familiar estável

O ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, relator do caso, explicou que o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA exige, para a adoção conjunta, que haja casamento civil ou união estável, além da comprovação de um ambiente familiar estável. Estes requisitos são verificados ao longo do processo por meio de documentos, entrevistas e estudo psicossocial. O objetivo é garantir que a criança seja acolhida em um lar seguro e afetuoso – o que, segundo o ministro, ficou comprovado nesse caso.

Ele destacou ainda que, mesmo sem decisão definitiva sobre a união estável, esse reconhecimento pode ser feito de forma incidental dentro da própria ação de adoção, apenas para esse fim. Como os adotantes declararam viver em união estável, e isso foi confirmado pelo estudo social e pelas testemunhas, o Tribunal entendeu que havia estabilidade familiar suficiente para autorizar a adoção conjunta.

Quanto à adoção póstuma, Villas Bôas Cueva considerou que havia manifestação clara da intenção do falecido em adotar a criança, o que autoriza a adoção após a morte do adotante, prevista no ECA.

No caso, embora a ordem do Cadastro Nacional de Adoção não tenha sido seguida, a criança já vivia com a família há mais de 13 anos. Para o relator, retirá-la desse ambiente causaria grande prejuízo, sendo mais importante garantir seu melhor interesse.

Assim, o STJ manteve a adoção válida, inclusive em relação ao adotante falecido, e rejeitou os recursos dos herdeiros.

Fonte: site IBDFAM

STJ analisa acesso a bens digitais no inventário e nomeação de “inventariante digital”; entenda

O acesso a bens digitais durante o processo de inventário ganhou destaque recentemente no Superior Tribunal de Justiça – STJ, quando a Terceira Turma começou a analisar um pedido de autorização judicial para uma inventariante acessar o computador de uma mulher já falecida. A relatora, ministra Nancy Andrighi, apresentou seu voto, mas a análise foi suspensa após pedido de vista do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.

A questão teve origem em um caso marcado pela morte simultânea de seis membros de uma mesma família – marido, esposa, filhos e respectivos cônjuges – em um acidente aéreo.

Ao analisar o caso, Nancy Andrighi destacou que o tema é inédito no Direito brasileiro e carece de regulamentação específica. Segundo a ministra, a inventariante pediu acesso ao computador a fim de identificar bens de valor econômico ou afetivo.

Direito da personalidade

A relatora alertou que a abertura irrestrita do dispositivo pode expor informações íntimas e intransmissíveis, protegidas pelo direito da personalidade, como registros de relacionamentos privados.

Ela propôs, então, a criação de um incidente processual de identificação de bens digitais, com nomeação de um “inventariante digital”, profissional habilitado para acessar o equipamento, manter sigilo e listar o conteúdo encontrado.

Segundo a ministra, o juiz, com base nessa listagem, decide quais bens são transmissíveis e quais devem ser preservados. Segundo a ministra, essa classificação é ato jurisdicional indelegável.

Nancy Andrighi também defendeu que o “inventariante digital” possa administrar temporariamente alguns bens até o fim do inventário, ressaltando que a falta de lei específica tem levado à perda de patrimônio digital no país. Ela votou por dar parcial provimento ao recurso, determinando o retorno do processo ao 1º grau para seguir o procedimento sugerido.

Reflexos no futuro

Diante da suspensão do julgamento, o vice-presidente da Comissão Nacional de Tecnologia do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, advogado e professor Marcos Ehrhardt Jr. comenta quais reflexos a decisão futura pode ter sobre o tratamento dos bens digitais em inventários no Brasil.

“O papel do STJ é unificar a aplicação do Direito federal infraconstitucional em nosso país. Logo, um precedente que apresente uma solução para questões que ainda carecem de regulamentação contribui para conferir maior visibilidade ao assunto, fomentar o debate acadêmico e profissional sobre o tema e ainda ajuda a conferir um pouco mais de previsibilidade para futuras decisões judiciais relacionadas ao assunto”, observa.

Ele destaca que o Judiciário deve oferecer soluções para casos concretos, mesmo na ausência de leis específicas sobre o tema. “A velocidade das transformações nas relações privadas decorrentes de novas tecnologias tem sido um fator preponderante na dificuldade de os órgãos legislativos apresentarem regulação tempestiva, suficiente e adequada para esta nova realidade”, avalia.

“Inventariante digital”

Ele destaca que a principal particularidade do caso analisado pelo STJ é o fato de o pedido de acesso aos bens digitais ter sido feito durante o inventário. Por isso, a ministra Nancy Andrighi sugeriu a inclusão do “inventariante digital”, cuja função é distinta do inventariante tradicional.

“Pode-se entender a figura do ‘inventariante digital’ como um auxiliar eventual da Justiça, que se equipara a um perito nomeado ad hoc pelo magistrado. Isto é, ele não ocupa cargo na administração da Justiça e atua por conta de seu conhecimento técnico ou científico. Sua nomeação encontra fundamento no disposto nos arts. 156 e 464 do Código de Processo Civil – CPC e não deve ser confundida com a figura do inventariante tradicional, que segue preservada”, pontua.

Segundo ele, o “inventariante digital” deve ser nomeado quando o juiz considerar necessário contar com conhecimento especializado para identificar ativos digitais passíveis de transmissão aos herdeiros e avaliar seu valor, com objetivo de evitar uma partilha desigual.

“Uma vez nomeado, o ‘inventariante digital’ deverá observar o dever de confidencialidade em relação aos bens a que tiver acesso, sendo passível de responsabilização civil e criminal em razão da violação de seu múnus no CPC”, afirma.

Segredo de Justiça

Marcos Ehrhardt Jr. acrescenta que, caso existam bens digitais de natureza pessoal, os autos do processo devem tramitar em segredo de Justiça para proteger os direitos da personalidade do falecido ou de terceiros.

“Sou favorável à designação de tal auxiliar, quando o caso concreto assim o exigir, atento à consideração de que é preciso que o Poder Judiciário assegure eficiência na prestação jurisdicional, com estrita observância ao ecossistema regulatório atualmente em vigor, em especial a Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD”, pondera.

Ele esclarece ainda que a classificação dos bens digitais é controversa, já que as propostas legislativas para regulamentação do tema ainda estão em tramitação. Os bens digitais existenciais, segundo ele, são aqueles ligados à esfera íntima e pessoal, ou seja, direitos da personalidade exercidos em ambiente eletrônico, como a imagem e conversas privadas.

“Alguns bens digitais não se enquadram exclusivamente como patrimoniais ou existenciais, especialmente quando são divulgados com fins econômicos. Nesses casos, pode ser necessário recorrer ao Judiciário para definir quais ativos podem ser transmitidos causa mortis”, pontua.

Fonte: Site IBDFAM

STJ discute anulação de paternidade por suposto erro em registro

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ começou a julgar ação que discute a anulação de um registro de paternidade, ajuizada após a morte do pai registral. O julgamento foi suspenso após pedido de vista do ministro Raul Araújo.

No caso dos autos, após o falecimento do pai registral, a filha buscou desconstituir a paternidade de outro filho registrado, alegando que não havia vínculo biológico nem socioafetivo entre eles. No processo, os herdeiros alegam que o vínculo foi reconhecido com base em erro, sem qualquer relação biológica ou socioafetiva entre o pai e o filho registrado.

O relator votou pela manutenção da certidão, mas houve divergência reconhecendo a possibilidade de anulação quando comprovados erros no registro e ausência de relação socioafetiva.

No julgamento, o ministro Antonio Carlos Ferreira observou que o pai registral já havia ajuizado ações anteriores, uma anulatória e outra negatória de paternidade, ambas extintas, a primeira por decadência e a segunda em razão da coisa julgada. Segundo o relator, diante disso, a atual demanda, apresentada sob a forma de ação declaratória de nulidade, seria uma tentativa de contornar esses obstáculos processuais. O ministro destacou que a controvérsia girava em torno da existência, ou não, de erro na lavratura do registro.

Antonio Carlos Ferreira concluiu que não havia vício na certidão, já que o registro foi realizado pela mãe da criança e não pelo pai. Assim, eventual equívoco do pai não teria repercussão no ato formal, que foi regularmente praticado.

Além disso, o relator ressaltou que não havia elementos que indicassem má-fé da mãe no momento da declaração, admitindo-se inclusive que ela própria pudesse ter sido induzida em erro. Dessa forma, entendeu que o registro civil não apresentava nulidade. O ministro Marco Buzzi acompanhou o relator.

O ministro João Otávio de Noronha divergiu do relator por considerar que o artigo 1.604 do Código Civil permite que qualquer interessado com legitimidade, e não apenas o pai registral, busque a anulação, desde que demonstrados dois requisitos indispensáveis: prova robusta de erro ou coação no reconhecimento da paternidade e ausência de vínculo socioafetivo entre pai e filho.

Noronha destacou que, no caso concreto, esses requisitos estariam presentes. Segundo ele, o pai registral acreditava, de forma equivocada, ser o pai biológico, tendo sido induzido em erro no momento do registro. Mais tarde, ao descobrir a verdade, ajuizou diversas ações tentando anular a paternidade, o que reforçaria sua intenção de não manter o vínculo jurídico.

O ministro também afirmou que as provas produzidas nos autos indicariam inexistência de relação socioafetiva, pois não havia registros de convivência, demonstrações de afeto ou reconhecimento público de filiação. Acrescentou ainda que a divergência entre paternidade biológica e registral, por si só, não basta para a anulação, mas quando somada à ausência de afeto e ao erro comprovado, justifica a medida.

Assim, concluiu que não seria possível manter o vínculo de filiação em desacordo com a realidade fática e biológica, votando pelo não provimento do recurso especial e, portanto, pela manutenção da decisão que anulou o registro.

fonte: site IBDFAM

TJSC reconhece direito de herdeiros e retira posse de ocupantes de imóvel

Em decisão recente, a 2ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça de Santa Catarina – TJSC afastou a posse de ocupantes de um imóvel e reconheceu o direito de herdeiros do antigo dono. O entendimento é de que os residentes eram meros detentores, não proprietários.

O colegiado reformou sentença que havia assegurado a posse de um imóvel a ocupantes no oeste do Estado por considerar que ficou comprovado que a ocupação se deu em caráter precário, sem a chamada intenção de agir como dono (animus domini), requisito essencial para a proteção possessória.

Os ocupantes ajuizaram a ação com o objetivo de manter a posse e impedir que os herdeiros do antigo proprietário praticassem atos de esbulho ou turbação. Eles afirmaram viver no imóvel desde 1998 e ter adquirido o bem por contrato de compra e venda firmado em 2011. A 1ª Vara da comarca de Capinzal concedeu liminar e, depois, sentença favorável à posse.

Os herdeiros apelaram da decisão sob o argumento de que a posse dos autores era clandestina e de má-fé, o que foi atestado inclusive pelas provas testemunhais, e que não praticaram esbulho.

Ao avaliar o caso, o relator concordou que não houve posse qualificada. Conforme provas dos autos, ao longo de quase 20 anos, os autores foram meros detentores do imóvel, pois conservaram a posse em nome do proprietário e sob suas ordens.

O relatório também constatou que, embora tenha havido contrato de compra e venda celebrado com o proprietário poucos anos antes de seu falecimento, a obrigação de quitar o valor não foi cumprida.

De acordo com o relator, ao celebrarem o contrato, os apelados/autores manifestaram de forma inequívoca o reconhecimento dos promitentes vendedores como legítimos proprietários do imóvel, recebendo deles a posse de maneira precária e assumindo o compromisso de pagar o valor acordado para que, posteriormente, lhes fosse transferida a propriedade do bem, o que, contudo, não foi cumprido.

Em grau recursal, os próprios autores admitiram que sua pretensão havia sido esvaziada após a decisão na ação de imissão. Ainda conforme o relatório, diante da ausência dos requisitos do artigo 561 do Código de Processo Civil – CPC, não se justifica a concessão da proteção possessória.

Os demais integrantes da Câmara seguiram por unanimidade o voto do relator, para reformar a sentença e inverter os ônus sucumbenciais em desfavor da parte autora.

Fonte: site IBDFAM