Categoria: Notícia

Banco que não toma providências quanto a golpe tem culpa concorrente

A culpa concorrente não exclui o dever do fornecedor em indenizar o consumidor por eventuais danos materiais. Isso só ocorre nos casos de culpa exclusiva. Assim, o 4º Juizado Especial Cível de Aracaju condenou um banco a restituir cerca de R$ 14,5 mil a uma cliente vítima de golpe pelo WhatsApp.

O golpista se passou pela irmã da vítima e pediu que ela lhe fizesse duas transferências. Menos de 24h depois, a correntista percebeu o golpe e comunicou ao banco. Somente cerca de um mês depois a instituição financeira informou que não poderia cancelar as transações, pois o valor já não estava mais em seu domínio

A juíza Laís Mendonça Câmara Alves ressaltou que, “mesmo diante de eventuais descuidos do consumidor, o banco não pode se eximir do dever de indenizar quando a fraude se dá no âmbito de operação bancária”.

Ela constatou a “imensa falta de cautela da reclamante, que não seguiu nenhuma das notórias recomendações de segurança tão veiculadas pela mídia nos dias atuais” — como checar a identidade do solicitante do dinheiro por meio de um número alternativo, ou ao menos desconfiar do fato de sua suposta irmã pedir um depósito na conta de desconhecidos.

Por outro lado, a magistrada notou que o banco “não demonstrou a prática de alguma conduta tendente a recuperar o numerário”. Segundo ela, o réu poderia ter solicitado o bloqueio do valor às instituições fincanceiras que o receberam. Caso o bloqueio fosse impossível, era função do réu comprovar.

“Apesar de todo o imbróglio haver sido originado por injustificada ausência de cautela da autora, a inércia do réu contribuiu para que o numerário não fosse bloqueado a tempo”, assinalou a juíza.

Mesmo assim, Laís negou o pedido de indenização por dano moral. Na sua visão, “a conduta do reclamado não produziu consequências aptas a afetar, de forma juridicamente relevante, a psique da autora”.

Fonte: CONJUR

STJ invalida testamento particular lavrado a próprio punho doando bens de baixo valor

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ invalidou o testamento lavrado de próprio punho, sem testemunhas, deixado por um homem que faleceu solteiro e sem herdeiros necessários. A decisão considerou que a exceção poderia criar precedente “perigoso”.

Segundo os autos, ele faleceu sem deixar descendentes ou ascendentes. Como não possuía relacionamento com seus “meios-irmãos”, já que a família não o reconhecia, lavrou de seu próprio punho testamento particular doando seus pertences.

Em primeiro grau, o juízo validou o testamento, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP derrubou a decisão.

No STJ, a ministra-relatora Nancy Andrighi, conheceu o recurso e proveu para restabelecer a sentença que julgou procedente o pedido de abertura, registro e confirmação do testamento particular, já que se trata de “bens de pequeno valor”.

Precedente ‘perigoso’

Ao analisar o caso, o ministro Marco Aurélio Bellizze disse que teria receio, pois seria formada uma tese entendendo como excepcional razões de ordem subjetiva, criando precedente para outros casos que envolvessem imóveis e grandes quantias.

Em voto-vista divergente, o ministro Moura Ribeiro destacou o artigo 1.879 do Código Civil, que dispõe que em circunstâncias excepcionais declaradas na cédula, o testamento particular de próprio punho e assinado pelo testador, sem testemunhas, poderá ser confirmado, a critério do juiz.

O ministro citou precedente que diz que em matéria testamentária, a interpretação volta-se no intuito de fazer prevalecer a vontade do testador, a qual deverá orientar, até mesmo, o magistrado quanto à aplicação do sistema de nulidades, que apenas não poderá ser mitigado diante da existência de fato concreto, passível de colocar em dúvida a própria faculdade que tem o testador e da forma como foi feito.

“Não há como alterar as conclusões do acórdão acerca da invalidade do testamento. Ainda que se admitisse sua validade, sem nenhuma testemunha e sem nenhuma circunstância excepcional declarada, seria imprescindível, no mínimo, que o testador tivesse assinado todas as folhas e o tivesse confeccionado em uma única sentada, que não é o caso. Se fosse codicilo, tudo bem, mas está intitulado como testamento”, finalizou.

Diante disso, o STJ negou provimento ao recurso especial.

Fonte: IBDFAM

TJMG: pai deverá indenizar filha por abandono afetivo

A Segunda Vara Cível da Comarca de Lagoa Santa do Tribunal de Justiça de Minas Gerais – TJMG determinou que uma jovem deverá ser indenizada pelo pai por abandono afetivo.

Segundo informações do Tribunal, ela ajuizou ação com pedido de indenização por danos morais em novembro de 2020, aos 19 anos, alegando que, desde o nascimento, foi rejeitada pelo pai, que nunca manteve contato com ela, limitando-se a prover auxílio financeiro.

A jovem sustentou que a indiferença do pai em relação a ela contribuiu para o desenvolvimento de um quadro de baixa autoestima, insegurança e depressão. Segundo a filha, o pai faltava aos encontros marcados sem avisar, não telefonava para saber como ela estava e nunca compareceu aos eventos no colégio e em datas significativas.

O juiz responsável pelo caso avaliou que as provas dos  autos informaram que não se configurou a ausência completa ou a ruptura plena dos laços, contudo “o réu nunca assumiu seu papel de pai, limitando-se a fazer o básico material, mas esquecendo de se fazer presente na realidade concreta e familiar de sua filha”.

Segundo o magistrado, embora não se possa obrigar os detentores do poder familiar a amar ou nutrir afeto pelo filho, existe o dever de dirigir a criação e a educação da criança ou do adolescente, o que implica participar ativamente da vida dos filhos.

Ele avaliou que o pedido inicial deve ser procedente, porque “com seu procedimento omisso, relapso e desleixado”, o pai causou danos psicológicos à jovem e deixou de cumprir sua obrigação legal e moral de prestar atendimento e orientação integral para a boa formação afetiva e psicológica dela.

Sendo assim, o pai foi condenado a pagar R$ 30 mil em danos morais. A decisão está sujeita a recurso e tramita sob segredo de justiça.

Fonte: IBDFAM

Por permitir conta de golpista, banco deve indenizar vítima de falso leilão

Por compreender que a instituição financeira é solidariamente responsável, pois negligenciou a segurança na abertura de conta pelos estelionatários, a 32ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) condenou um banco ao pagamento de R$ 76,7 mil a uma vítima do chamado “golpe do leilão falso”.

Na ocasião, o homem arrematou um carro em um site. Para oficializar o pagamento, ele depositou o valor correspondente em uma conta corrente indicada pelos golpistas. A defesa da vítima sustentou que o banco falhou na prestação dos serviços ao deixar de se certificar quanto à autenticidade dos documentos e informações que foram apresentadas na abertura, o que viola o artigo 2 da Resolução 4.753/2019 do Banco Central.

O relator do caso, desembargador Andrade Neto, se baseou na Súmula 479 do Superior Tribunal de Justiça, que diz que instituições financeiras respondem objetivamente pelos dados gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.

“Evidente ter a instituição financeira corré atuado de modo negligente ao chancelar a abertura da conta corrente sem se certificar da veracidade das informações.”

O magistrado lembrou o trecho da Resolução 4.759/2019 do Banco Central, que diz que as instituições financeiras, para fins de abertura de conta de depósitos, devem adotar procedimentos e controles que permitam verificar e validar a identidade e a qualificação dos titulares da conta.

“Nestas circunstâncias, evidenciada a falha na prestação dos serviços, e presente o nexo causal com o resultado lesivo, uma vez que a consumação da fraude não seria possível sem que houvesse a abertura e utilização de conta bancária mediante dados falsos, de rigor o reconhecimento do dever da instituição de corré de indenizar o prejuízo material experimentado pelo autor”, afirmou o relator.

Danos morais
Os R$ 76,7 mil que o banco deve pagar à vítima correspondem ao valor transferido para a conta corrente ilegal. Andrade Neto não reconheceu a responsabilidade solidária da instituição financeira pela reparação dos danos morais.

“Se é certo que a negligência da instituição apelada no tocante à abertura da conta foi decisiva para a eclosão do prejuízo material, o mesmo não se pode dizer em relação ao dano extrapatrimonial, pois, de acordo com a petição inicial, a causa de pedir da pretensão deduzida recai exclusivamente na ocorrência da fraude praticada por terceiros e todas as consequências desagradáveis daí derivadas, não tendo sido atribuída especificamente à instituição financeira nenhuma conduta apta a ensejar a sua responsabilização, ressaltando-se que a mesma providenciou o cancelamento da indigitada conta corrente assim que tomou conhecimento dos acontecimentos.”

A condenação por danos morais não deve alcançar o banco, segundo o magistrado, pois inexiste relação causal que enseje a responsabilidade pelos prejuízos extrapatrimoniais causados.

A vítima foi representada pelo advogado Eduardo Benini, do escritório Scavazzini Suriano Benini Minelli Advogados. Ele comenta que, ao decidir dessa forma, o TJ-SP “privilegia a proteção dos consumidores e estimula os bancos a observarem as normas já existentes para abertura de contas à distância, bem como a desenvolverem novas tecnologias e diretrizes internas capazes de diminuir o número de fraudes que demandam a utilização de seus sistemas digitais”.

Fonte: CONJUR

STJ concede liminar para permitir reintegração de criança à mãe após entrega voluntária

O Superior Tribunal de Justiça – STJ concedeu liminar permitindo a reintegração de um bebê recém-nascido à mãe após ela entregá-lo para adoção voluntariamente. A mulher havia feito a entrega legal do bebê, mas se arrependeu dentro do prazo estipulado pela Resolução 485/2023 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, que é de 10 dias.

Antes de chegar ao STJ, o pedido de reintegração havia sido indeferido tanto em primeiro grau quanto no Tribunal de Justiça do Estado do Paraná – TJPR em julgamento de agravo.

Ao analisar o caso, a presidente do STJ, ministra Maria Thereza de Assis Moura, ressaltou que a decisão de impedir a reintegração da criança à mãe não possuía justificativa concreta, apenas ponderava que seria necessária a realização de estudo pela equipe de acolhimento e encaminhamento da genitora para avaliação e atendimento psicológico, a fim de averiguar o melhor interesse da criança, “exigência inexistente no ordenamento jurídico”.

A ministra mencionou ainda laudo técnico elaborado por psicólogo que sugere a necessidade de conceder uma oportunidade à mãe para que ela reconsiderasse a decisão de entregar a criança.

No laudo, o psicólogo diz que a mulher relatou histórico de ansiedade e depressão, e que demonstra compreender que sua decisão pela entrega do filho foi equivocada, “sendo baseada em vulnerabilidades e inseguranças, as quais considera contornáveis, passado seu momento de insegurança”.

Para a ministra, ficou evidente o fumus boni iuris e o periculum in mora, a autorizar o deferimento da medida de urgência.

Assim, determinou o retorno imediato do recém-nascido ao convívio da mãe. Além disso, estabeleceu que ela e a criança recebam acompanhamento pelo prazo de 180 dias.

O processo tramita em segredo de justiça.

Decisão cumpre a lei

A advogada Silvana do Monte Moreira, presidente da Comissão Nacional de Adoção do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, destaca que a decisão cumpre o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (8.069/1990), tanto no que diz respeito ao prazo do exercício do arrependimento quanto em relação ao acompanhamento da genitora por uma equipe profissional.

“A decisão cumpre a lei, mas, para isso, é preciso acompanhar essa família e verificar se o melhor interesse da criança está sendo atendido”, explica.

Segundo a advogada, esse princípio está previsto no artigo 3º da Convenção Internacional sobre Direitos da Criança, que diz: “Todas as ações relativas à criança, sejam elas levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de assistência social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar primordialmente o melhor interesse da criança”.

“A referida convenção foi incorporada à legislação brasileira por meio do Decreto nº 99.710/1990. Assim, é uma legislação em vigor no Brasil”, afirma.

Fonte: IBDFAM

STJ: doação inoficiosa é verificada no momento da liberalidade

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ confirmou que é na data da liberalidade que se determina se a doação realizada avançou sobre o patrimônio correspondente à legítima dos herdeiros necessários – o que a tornaria nula.

No caso concreto, os herdeiros do falecido ajuizaram ação para anular a doação de um imóvel. Em primeira instância, o juiz anulou integralmente a doação, pois entendeu que o homem não observou o valor que deveria ser reservado aos herdeiros necessários.

Houve recurso da pessoa que recebeu a doação. O Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP limitou a nulidade à parte que teria excedido a porção disponível do patrimônio. Ao STJ, a donatária alegou que a legítima dos herdeiros era garantida pelos ativos financeiros que o homem possuía no exterior.

A ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, confirmou que, quando a doação foi feita, o falecido possuía mais de US$ 2 milhões em ativos financeiros no exterior. O imóvel em discussão não valia mais do que 50% de tais ativos.

Para a magistrada, o destino dos outros bens não interfere na controvérsia. “É irrelevante saber se os demais bens existentes ao tempo do ato de liberalidade foram, ou não, efetivamente revertidos em favor dos herdeiros necessários após o falecimento do doador ou se os referidos bens compuseram, ou não, o acervo hereditário”, pontuou.

Fonte: IBDFAM

CNJ pede manifestação do CFM e ANVISA sobre pedido de providências do IBDFAM que afeta inseminação caseira

O Conselho Nacional de Justiça – CNJ, por meio do Corregedor Nacional de Justiça,  Ministro Luis Felipe Salomão, intimou o Conselho Federal de Medicina – CFM e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa para se manifestarem acerca do Pedido de Providências do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, que busca a revogação da indispensabilidade de apresentação de assinatura do diretor técnico da clínica em casos de reprodução assistida. O IBDFAM entende que a exigência, além de custosa, limita o exercício da cidadania e é discriminatória, pois desconsidera a inseminação caseira.

Neste sentido, o IBDFAM busca a revogação do artigo 17, II, do Provimento 63/2017 do CNJ. O texto prevê como indispensável para fins de registro e de emissão da certidão de nascimento a apresentação de “declaração, com firma reconhecida, do diretor técnico da clínica, centro ou serviço de reprodução humana onde foi realizada a reprodução assistida, indicando que a criança foi gerada por reprodução assistida heteróloga, assim como o nome dos beneficiários”.

O ministro reconheceu que a questão envolve Resolução do Conselho Federal de Medicina e aspectos técnicos de saúde/sanitários, motivo pelo qual recomendou a manifestação das entidades. O CFM e a Anvisa têm o prazo de 60 dias para apresentarem considerações, se assim desejarem.

No documento enviado ao CNJ, o IBDFAM destaca que o CFM, ao adotar normas éticas para a utilização de das técnicas de reprodução assistida, expressamente autoriza o seu uso para homoafetivo, transgêneros, inclusive gestação compartilhada aos casais femininos (Resolução 2.294/2021). A normativa levou o CNJ a editar o Provimento 63/2017 para admitir o reconhecimento e o registro da dupla parentalidade e, no caso da homoparentalidade, expressamente proíbe que conste distinção quanto à ascendência paterna ou materna.

Ainda conforme o IBDFAM, o Provimento do CNJ parte do pressuposto de que a única forma de se chegar à gravidez seja por meio da reprodução assistida, “malgrado seja consabido que, em face dos altos custos desses procedimentos, as pessoas estão fazendo uso da autoinseminação, também chamada de ‘inseminação caseira”.

Regulamentação

Para o advogado Ricardo Calderón, diretor nacional do IBDFAM, a regulação jurídica da reprodução assistida caseira exige atenção e cautela. Ele considera prudente a iniciativa do CNJ de ouvir outras entidades sobre a temática. “A amplitude de fatos jurídicos inerentes a tais questões justifica a participação de outros atores nesse processo decisório.”

“É necessário tutelar de maneira adequada o registro de filhos havidos pelos ‘processos de reproduções informais’, que já estão a se manifestar na nossa realidade fática. Entretanto, não se pode negar que a inovação destas questões, bem como as dúvidas inerentes a qual a melhor forma de se obter tal registro, levem a uma análise cautelosa por parte dos órgãos responsáveis”, explica o especialista.

O advogado reconhece a importância de garantir o acesso ao registro adequado de filhos havidos por tais processos de reprodução assistida caseira. “Entendo como prudente e adequada a conduta do Conselho Nacional de Justiça de ouvir entidades que podem contribuir para esse importante tema”, conclui.

Fonte: IBDFAM

Justiça do Rio de Janeiro reforma decisão e decreta divórcio liminarmente

O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro – TJRJ deu provimento, por unanimidade, a recurso de Agravo de Instrumento interposto por uma mulher contra a decisão que indeferiu a decretação liminar de seu divórcio, por meio da tutela de evidência.

De acordo com os autos, a mulher continua casada embora esteja separada de fato há aproximadamente cinco anos, pois o marido se recusa a conceder o divórcio. Atualmente, ela se encontra em um novo relacionamento e apresenta o desejo de constituir família, mas a intenção é frustrada diante da recusa do homem.

Ela argumentou que o divórcio, indeferido pela 1ª Vara de Família da Regional da Pavuna, no Rio de Janeiro, é direito potestativo e incondicional, que não comporta produção probatória ou contraditório, sendo o elemento volitivo de um dos cônjuges o único requisito indeclinável, já que o réu não pode se opor ao pedido de decretação do divórcio.

Diante disso, ela defendeu a possibilidade de julgamento parcial do mérito, com prosseguimento da demanda quanto à eventual partilha de bens. Desse modo, ela protocolou o pedido de reforma da decisão agravada para decretar liminarmente o divórcio e determinar a averbação em cartório.

Narrativa coerente e fundamentada

O desembargador-relator do caso avaliou que a autora “apresenta uma narrativa coerente e devidamente fundamentada, acompanhada da prova adequada, observando-se, ainda, que a pretensão deduzida não exige maior dilação probatória, além de restar caracterizado o risco de dano irreparável à parte”.

Ele evocou a Emenda Constitucional 66/2010, concebida pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, que inseriu a possibilidade do divórcio direto no ordenamento jurídico brasileiro, e observa que, com ela, “o divórcio passou a ostentar caráter potestativo e incondicionado, o que possibilita a sua decretação antecipada, initio litis, relegando a momento posterior eventual discussão acerca das questões patrimoniais referentes à partilha e ao regime de bens”.

“Se um dos cônjuges não mais deseja permanecer casado, inexiste óbice para a decretação do divórcio direto, uma vez que não há necessidade de dilação probatória para a dissolução do vínculo conjugal”, diz um trecho da decisão.

Tutelas provisórias

Cristiane Ramos de Oliveira, advogada do caso e membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, explica que o Código de Processo Civil – CPC de 2015 ampliou a possibilidade de concessão de tutelas provisórias para incluir hipóteses em que não há urgência, o que prevê o instituto da tutela de evidência.

“Aliado ao fato de que o divórcio é um direito potestativo, ou seja, que basta apenas a vontade de um cônjuge para que seja decretado o divórcio, o outro nada poderia arguir que impedisse a decretação do divórcio”, afirma.

“Assim, surge a possibilidade de decretação do divórcio antes mesmo da citação do outro cônjuge, o que resulta em celeridade processual e evita delongas, seja pelo fato de o réu furtar-se à citação ou seja pelo fato do casal estar separado de fato há tanto tempo, que um desconhece o paradeiro do outro. Possibilita que as partes se desliguem uma da outra, sem uma demora desnecessária”, pontua.

Para ela, uma decisão como esta possui cunho social na medida em que “incentiva e facilita” o divórcio, estimulando a busca pela regularização do estado civil.

“Isso evita confusões jurídicas, uma vez que a separação de fato não é um estado civil propriamente dito, não podendo ser averbado, evitando que pessoas legalmente casadas façam uniões estáveis”, diz.

De acordo com a advogada, uma decisão como esta, apesar de possuir respaldo legal, ainda é incomum na Justiça brasileira.

“Muitas vezes espera-se que a outra parte precise ser ouvida, designando, inclusive, audiência de conciliação. Uma decisão como esta é obtida em sede recursal e abre precedente importantíssimo que, se reiterado, poderá gerar entendimento uniforme, facilitando futuras decisões”, afirma.

Fonte: IBDFAM

Justiça de São Paulo modifica regime de guarda compartilhada por histórico de violência doméstica do pai

A Segunda Vara da Família e Sucessões do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – TJSP modificou o regime da guarda de dois adolescentes de compartilhada para unilateral em favor da mãe. Além disso, ficou decidido que as visitas do pai são livres, a critério dos jovens.

De acordo com os autos, a família vivenciava o regime de guarda compartilhada estabelecida judicialmente por meio de acordo entre as partes. No entanto, os adolescentes se recusavam a manter contato e convivência com o pai pelo histórico de violência doméstica do homem.

No processo, o laudo do estudo social constatou que não há bom relacionamento entre as partes. Os dois filhos foram ouvidos em juízo e demonstraram não ter interesse em ter contato com o pai por conta das situações de violência vivenciadas.

Diante disso, o juízo sentenciou a mudança da guarda de compartilhada para unilateral em favor da mãe, assim como estabeleceu visitas livres a critério dos adolescentes.

Melhor interesse

Para Bruno Campos de Freitas, advogado do caso e membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, a decisão é correta por atender ao princípio constitucional do melhor interesse da criança ou do adolescente.

“Apesar de o ordenamento jurídico estabelecer a guarda compartilhada como regra, esse modelo pode ser afastado nos casos em que ele não atende ao bem-estar da criança e do adolescente, como no caso narrado”, explica.

Para ele, fatos relacionados à violência doméstica, mesmo que envolvendo somente o casal parental, devem ser levados em conta nas decisões que regulamentam a guarda de crianças e adolescentes.

“O entendimento contrário a isso não é compatível com a própria natureza da guarda compartilhada, que pressupõe, no mínimo, uma comunicação saudável entre os genitores”, afirma o advogado.

“No caso em questão, o histórico de violência doméstica perpetrado pelo genitor em desfavor da genitora, assim como o deferimento de medidas protetivas, inviabiliza, por si só, o exercício da guarda compartilhada, pois impossibilita a comunicação entre os pais para tratar das questões referente aos filhos.”

Violência doméstica

Para o advogado, a decisão é um avanço na luta contra as problemáticas por trás da violência doméstica.

Sobre o tema, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados aprovou, em 29 de março deste ano, o Projeto de Lei 2.491/2019, que estabelece o risco de violência doméstica ou familiar como impedimento à guarda compartilhada de crianças e adolescentes.

Segundo o projeto, se houver histórico, ameaça ou risco de violência doméstica ou familiar, o juiz não deve aplicar a guarda compartilhada entre os pais ou familiares da criança.

“Crianças e adolescentes são sujeitos de direitos que, em determinada idade, já possuem discernimento para opinar sobre determinadas questões da sua própria vida”, afirma Bruno Campos de Freitas.

“É injusto obrigá-los a se submeter a um dos genitores pela simples imposição legal, pois é necessário analisar se, na prática, irá atender aos interesses da criança e do adolescente, devendo ser rechaçada sempre que se mostrar prejudicial à sua formação e desenvolvimento saudável após verificar as circunstâncias do caso e da dinâmica familiar”, afirma o advogado.

Fonte: IBDFAM

Abandono afetivo e o PL nº 3.012/2023: medidas preventivas

As crianças e adolescentes são objeto de proteção integral em razão da Constituição e do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), inclusive sob o aspecto emocional e psicológico de desenvolvimento. Portanto, além da assistência financeira, os genitores devem prestar amparo afetivo aos seus filhos, sob pena de serem responsabilizados civilmente, em virtude de eventual abandono afetivo praticado, a depender da demonstração de alguns requisitos.

Conforme Gagliano e Pamplona Filho (2020), é possível identificar o abandono afetivo quando ocorre a negligência de um dos integrantes de uma relação familiar no que tange ao dever de cuidado e afeto para com o outro. Essa conduta pode acarretar danos emocionais de relevância, configurando, assim, uma possível violação dos direitos fundamentais à dignidade, à afetividade e à convivência familiar.

O entendimento dos tribunais acerca do tema vem evoluindo nos últimos anos, de modo que há diversos precedentes nos quais o dever de indenizar é reconhecido em virtude do abandono afetivo. O reconhecimento ocorre desde que comprovada a conduta omissiva ou comissiva do genitor (ato ilícito); o trauma ou prejuízo psicológico sofrido pelo filho (dano); e o liame causal entre o ato ilícito e o dano.

A exemplo desta evolução jurisprudencial, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) recentemente proferiu uma decisão na qual determinou a condenação do pai ao pagamento de uma indenização por danos morais no valor de R$ 30 mil à sua filha, em virtude da ruptura abrupta do vínculo afetivo entre ambos quando a criança tinha apenas seis anos de idade.

Em decorrência do abandono afetivo, constatado por meio de laudo pericial, a menina sofreu graves repercussões psicológicas e experimentou sintomas ocasionais de ordem somática, como tonturas, enjoos e crises de ansiedade. No referido julgamento, o colegiado da 3ª Turma do STJ adotou o entendimento de que não existem limitações legais para a aplicação das normas de responsabilidade civil no contexto das relações familiares.

Contudo, apesar da construção jurisprudencial e doutrinária em avanço, a falta de regulamentação legal e específica sobre o tema gera insegurança jurídica, na medida em que o reconhecimento da responsabilidade civil depende do entendimento do juízo ou tribunal competente para o julgamento de cada caso.

O Projeto de Lei nº 3.012/23 visa alterar o ECA (Lei 8.069/90) no sentido de estabelecer medidas preventivas entre as atribuições do Conselho Tutelar, como a notificação do pai ou da mãe ausente, para fins de aconselhamento e aplicação das demais posturas de prevenção.

As alterações propostas também se direcionam ao Código Civil (Lei 10.046/2002), a fim de estabelecer sanções ao genitor que pratica o abandono, incluindo, por exemplo, a aplicação de multa, a alteração das obrigações fixadas, a alteração da guarda e a caracterização expressa da conduta de abandono afetivo como ato ilícito, e, portanto, passível de responsabilização.

A expectativa é de que o projeto seja aprovado e traga consigo mais garantias às crianças e adolescentes, coibindo a prática reiterada de abandono afetivo, implementando uma política de prevenção e assistência, para que o desenvolvimento de todos ocorra da forma mais ampla possível.

Conforme Venosa (2021), ao reconhecer a responsabilidade civil por abandono afetivo, tem-se como objetivo garantir proteção jurídica aos direitos da personalidade, com ênfase no direito ao afeto, à dignidade e à integridade emocional das pessoas que estão envolvidas em relações familiares.

Sendo assim, dada a relevância dos direitos tutelados, a iniciativa legislativa em questão (PL 3.012/23) deve ser objeto de grande atenção e cuidado, sobretudo porque visa combater o problema em três frentes, ao positivar a possibilidade de responsabilização daqueles que praticam o abandono, de compensação das vítimas e de medidas extrajudiciais de prevenção.

Fonte: CONJUR