Autor: Thaisa Pellegrino

STJ garante continuidade de ação para corrigir profissão em certidão de casamento

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ negou recurso do Ministério Público – MP que buscava extinguir uma ação de retificação de registro civil proposta por um homem para alterar sua certidão de casamento. Para a Corte, há interesse processual do autor na correção de possível erro no documento, e ele deve ter a oportunidade de apresentar provas que sustentem sua alegação.

No caso, o homem afirmou que sempre exerceu a profissão de lavrador, mas sua certidão de casamento registrava a ocupação de pedreiro. Ele apresentou documentos para comprovar a informação e explicou que a correção era necessária porque a divergência de dados vinha dificultando a concessão de um benefício previdenciário.

O juízo considerou que a informação sobre a profissão na certidão de casamento seria um dado transitório e não essencial e, com base nisso, extinguiu o processo sem analisar o mérito, apontando falta de interesse processual. O Tribunal de Justiça da Bahia – TJBA, no entanto, reformou a sentença e determinou o prosseguimento da ação.

No recurso interposto no STJ, o MP sustentou que a ausência de interesse processual estaria evidenciada pela falta de utilidade da tutela judicial pretendida pelo autor da ação.

Presunção relativa de veracidade

Ao analisar o caso, a relatora, ministra Nancy Andrighi, afirmou que os registros públicos, como a certidão de casamento, em regra são imutáveis, de acordo com o regime jurídico especial estabelecido na Lei 6.015/1973, a chamada Lei de Registros Públicos. Contudo, ela reconheceu que esses documentos possuem presunção relativa de veracidade, pois podem conter erros ou omissões, que devem ser identificados e corrigidos.

No entendimento da relatora, o pedido de retificação pode ser ajuizado por quem estiver vinculado ao documento (inclusive ascendentes, descendentes e herdeiros), situação que demonstra o seu interesse jurídico na correção do erro. Ela apontou, porém, a necessidade de diferenciar a retificação, que busca corrigir erro, da alteração, que substitui um estado por outro sem haver necessariamente um erro. Como exemplo da segunda hipótese, a ministra citou a alteração do regime de bens do casamento.

Quanto à informação sobre a profissão dos cônjuges, Andrighi lembrou que é um dos elementos da certidão de casamento, segundo disposto na Lei de Registros Públicos. Para ela, o fato de não haver na legislação previsão de procedimento específico para a correção de erros referentes aos elementos da certidão não torna o pedido juridicamente impossível, pois não há vedação ou incompatibilidade legal. Desse modo, sendo constatado erro, caberá a retificação, que deve ser requerida conforme o artigo 109 da norma, que trata da correção de registro civil.

Petição fundamentada

A ministra observou que, nos termos da Lei de Registros Públicos, a correção de registro civil deve ser feita por petição fundamentada, juntamente com documentos e indicação de testemunhas.

Por outro lado, ela explicou que o interesse processual é um dos requisitos para a apreciação do mérito da ação, ao lado da legitimidade, e o magistrado deve avaliar a presença desse requisito com base nas afirmações feitas pelo autor na petição inicial.

Assim, para ser verificado o interesse processual na ação que pede a retificação de registro civil, basta que a petição inicial traga informações suficientes acerca da possível existência de erro. “Se assiste razão ou não ao autor, trata-se de julgamento de mérito, hipótese de procedência ou improcedência do pedido”, declarou.

Fonte: Site IBDFAM

Justiça autoriza citação por WhatsApp de pai que vive em Angola para garantir pensão à filha adolescente

A Justiça de São Paulo autorizou a citação, por meio do aplicativo de mensagens WhatsApp, de um homem residente em Angola, na África, em um processo de pensão alimentícia movido por sua filha adolescente, que vive no Brasil com a mãe. A medida foi tomada após mais de dois anos de tentativas frustradas de citação por carta rogatória, procedimento tradicional para comunicações internacionais.

A ação foi iniciada em julho de 2023, quando a mãe da adolescente buscou a Defensoria Pública para pedir pensão alimentícia ao pai da filha, que mora no país africano. Desde a separação do casal, a adolescente sempre esteve sob a guarda da mãe, que arcava sozinha com todas as despesas, incluindo plano de saúde, tratamento odontológico, aulas de inglês e transporte escolar.

Segundo informações da Defensoria, por se tratar de um processo envolvendo uma pessoa que mora fora do Brasil, a citação do pai dependia de um procedimento chamado “carta rogatória”, que envolve vários órgãos no Brasil e no exterior. Segundo o órgão, esse tipo de  trâmite é conhecido pela demora e, muitas vezes, não traz o resultado esperado, pois pode acontecer de a pessoa não ser encontrada no endereço informado.

No caso em questão, após dois anos de espera e sem resposta das autoridades estrangeiras, a Defensoria Pública decidiu buscar alternativas para garantir o direito da adolescente. Assim, o órgão entrou em contato com a mãe da adolescente e conseguiu o número de WhatsApp do pai, que ainda mantinha contato com a família. Com essa informação, a Defensoria pediu à Justiça autorização para que a citação fosse feita por meio do aplicativo de mensagens, de forma remota.

O pedido apontou que a Resolução 354/2020, do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, e orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça – STJ admitem a citação por meio do WhatsApp.

Com a anuência judicial, a citação foi realizada por mensagens de texto, voz e chamada de vídeo, permitindo o andamento do processo. A Justiça determinou que o pai pague pensão alimentícia à filha até o 5º dia útil de cada mês.

Fonte: site IBDFAM

Mãe se arrepende e tenta alterar nome de filha recém-nascida, mas cartório nega pedido

Uma empresária de 26 anos, de Indaiatuba, em São Paulo, recorreu à Corregedoria-Geral de Justiça após ter o pedido de alteração do nome da filha recém-nascida negado pelo cartório. A criança foi registrada como Ariel em agosto, mas os pais, dias depois, solicitaram a troca para Bella, alegando arrependimento. As informações são do G1.

O cartório fundamentou a negativa no entendimento de que a legislação não prevê alteração de nome apenas por arrependimento, uma vez que ambos os genitores manifestaram concordância no momento do registro.

A instituição reforçou que a possibilidade de oposição ao prenome, prevista no artigo 55, § 4º da Lei 6.015/1973, aplica-se apenas a situações em que um dos pais não participou da escolha.

O caso agora será analisado pela Corregedoria, que designou juiz competente para avaliar o pedido. Caso a solicitação não seja aceita, a família poderá ingressar com ação judicial.

A Associação dos Registradores de Pessoas Naturais de São Paulo – Arpen-SP também se manifestou, destacando que a lei garante alteração do nome em até 15 dias do registro apenas quando há oposição fundamentada de um dos genitores que não tenha participado da decisão inicial, e não por arrependimento posterior.

Flexibilidade

A registradora Márcia Fidelis Lima, presidente da Comissão Nacional de Registros Públicos do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, observa que a legislação brasileira, historicamente rígida quanto à imutabilidade do nome, tornou-se mais flexível nos últimos anos, especialmente com a Lei 14.382/2022.

De acordo com ela, as possibilidades de alteração do prenome após o registro seguem quatro caminhos:

a) Nos primeiros 15 dias após o registro, qualquer dos pais pode requerer, de forma fundamentada e havendo consenso dos dois, que o cartório faça tramitar um procedimento administrativo. Caso deferido, este dará origem a um ato registral de averbação, alterando o registro. Sem consenso, remete-se ao juiz.

b) Após a maioridade, a pessoa pode alterar imotivadamente o prenome, uma única vez, diretamente no RCPN, devendo buscar a via judicial caso já tenha se valido da esfera administrativa anteriormente.

c) Em caso de erro comprovado, é possível a correção por meio de procedimento administrativo, que, se deferido, gera ato de averbação de retificação.

d) Em qualquer hipótese, motivadamente, pela via judicial.

Na primeira hipótese, explica a especialista, as negativas costumam ocorrer quando: “passou o prazo de 15 dias; não há consenso entre pai e mãe; há indício de fraude; ou quando a serventia adota interpretação restritiva do § 4º do art. 55 da Lei 6.015/1973, entendendo que a ‘oposição’ se aplica apenas aos casos em que um deles registrou sozinho e o outro discorda”.

Segundo Márcia, a interpretação tem como base o precedente da Terceira Turma do STJ que inspirou a criação da norma, defendendo que ela deveria se limitar ao caso paradigma.

Impactos

A registradora avalia os impactos legais e sociais para a criança quando há alteração do nome. “No plano legal, a alteração exige atualização documental (certidão, comunicação a bases), mas o risco de confusão é muito baixo porque a mudança ocorre nos primeiros dias, quando ainda não houve muito uso social do nome para identificar a criança.”

“Desde 2015, o CPF é integrado ao registro de nascimento e constitui o número único nacional que também consta do documento de identidade. Isso reforça a identificação da criança, independentemente da alteração do nome”, pontua.

Já no plano social, acrescenta Márcia, o nome é elemento central da identidade. “Mudanças muito precoces raramente geram histórico público amplo.”

A especialista acredita que boas práticas dos cartórios, como restringir o uso de certidões em inteiro teor apenas para quando for necessário, ajudam a evitar estigmatização, já que, nesses casos, não há exigência legal de menção ao conteúdo da averbação em certidões resumidas.

“Em qualquer cenário, deve prevalecer o melhor interesse da criança, diretriz central do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA e da Constituição.”

Estatísticas

Márcia Fidelis explica que casos como esse podem ser poucos numérica e estatisticamente, mas quando ocorrem podem gerar desgosto e sensação de injustiça para a família.

A alteração, segundo ela, quando autorizada, é simples, desburocratizada, de baixo custo e não traz insegurança jurídica. “No Judiciário, quando apenas um dos pais comparece ao registro e o outro comprova o descumprimento da escolha prévia, a jurisprudência do STJ tem admitido a correção do nome, justamente para coibir o rompimento unilateral do acordo parental.”

“Foi exatamente um desses casos que levou o Poder Legislativo a introduzir a regra atual, que extrajudicializou o tema. Contudo, nos pedidos de arrependimento com consenso após ambos terem assinado o registro, há divergência interpretativa: parte da doutrina defende a aplicação do § 4º do art. 55 de forma teleológica (havendo consenso → procedimento administrativo → ato de averbação); outra parte adota leitura restritiva, remetendo ao juiz”, avalia.

Na visão da registradora, o caso recente de São Paulo ilustra a disputa já levada ao Judiciário. “Eu me filio ao primeiro entendimento, pois entendo que a norma, uma vez editada, ganha vida própria e pode ser interpretada pelos critérios do Direito, desvinculando-se da literalidade do caso que a originou.”

Consequências

Para a diretora nacional do IBDFAM, o registrador civil desempenha papel fundamental para a orientação da população, sobretudo para famílias de baixa renda ou baixa escolaridade, com pouco acesso a informações jurídicas. “As pessoas buscam esclarecimentos diretamente no cartório sobre demandas que afetam sua realidade. Oferecer essa orientação e indicar os caminhos juridicamente previstos é parte essencial da nossa função como prestadores de um serviço público relevante.”

“No caso da alteração de nome, o primeiro local que as famílias procuram para se informar é o próprio registro civil, em que o nome existe juridicamente. A escolha do nome envolve aspectos jurídicos e afetivos e impacta a vida civil da criança e da família. Uma orientação clara reduz retrabalho, frustração e judicialização, e protege o interesse superior da criança, que deve nortear qualquer decisão familiar ou estatal”, observa.

Ela acrescenta: “Além disso, o registrador civil, como profissional do Direito, tem liberdade interpretativa das normas, sempre dentro dos critérios legais, o que lhe permite aplicar soluções administrativas que tragam efetividade e segurança, sem necessidade de recorrer ao Judiciário em todas as situações”.

Segundo a registradora, a informação prévia — sobre prazo, necessidade de consenso e limites da lei — evita expectativas equivocadas e crises desnecessárias. “Também reforça a importância do trabalho eficiente do registrador civil”, conclui.

Fonte: Site IBDFAM

Justiça do Mato Grosso do Sul majora alimentos com base na teoria da aparência

Com base na chamada teoria da aparência, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul – TJMS decidiu majorar o valor da pensão provisória de uma criança de três anos, filha de um casal cuja união estável foi desfeita.

Em primeira instância, o valor havia sido estabelecido em um salário mínimo, mas a 4ª Câmara Cível do Tribunal estadual entendeu que o montante era insuficiente diante das necessidades da filha e dos indícios de que o pai mantém padrão de vida elevado.

Com base na teoria da aparência – que permite considerar sinais exteriores de riqueza quando não há comprovação formal de renda – os magistrados majoraram a pensão para um salário e meio.

Segundo o colegiado, a ausência de provas formais de renda não impede a Justiça de considerar sinais exteriores de riqueza, como estilo de vida, viagens e ostentação em redes sociais, para fixar o valor da obrigação. A decisão foi unânime e poderá ser revisada futuramente, caso surjam novas provas sobre a real situação financeira das partes.

O pedido de pensão compensatória à ex-companheira foi rejeitado, por falta de comprovação de desequilíbrio econômico grave ou ausência de condições próprias de subsistência.

O processo tramita em segredo de Justiça.

Real condição financeira

Para a advogada Marla Diniz Brandão Dias, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, que atuou no caso, a questão central é garantir que o valor da pensão reflita a real condição financeira do genitor-alimentante, especialmente quando ele apresenta um padrão de vida diferente do declarado no processo ao ocultar patrimônio ou subestimar seus próprios rendimentos.

“Trata-se de uma questão que vai além deste processo e reflete uma realidade enfrentada por muitas mulheres e crianças no Brasil, que encontram grandes dificuldades para ter garantido o direito a alimentos compatíveis com o padrão de vida dos genitores”, afirma.

Ela considera que a decisão do TJMS foi “sensível e responsável” ao olhar além da renda formal declarada e considerar sinais exteriores de riqueza para fixar um valor mais justo.

“Esse olhar assegura a dignidade de crianças e adolescentes sem sobrecarregar ainda mais a genitora que, tão comumente, já arca com a maior parte do cuidado e do sustento. Além disso, tem um efeito pedagógico importante por inibir comportamentos de má-fé de devedores que buscam se esquivar de suas responsabilidades por meio de artifícios”, avalia.

Forma versus conteúdo

A advogada considera também que decisões dessa natureza rompem com a visão de que somente documentos formais podem ser usados como prova para avaliação de renda do alimentante.

“Ao adotar a teoria da aparência, o Tribunal mostra estar atento à realidade social, reconhecendo que o padrão de vida exibido pode ser incompatível com a renda declarada. E incorpora, ainda que implicitamente, uma perspectiva de gênero, ao reconhecer que a ocultação patrimonial recai quase sempre em prejuízo das mães, que já acumulam desproporcionalmente as tarefas de cuidado”, analisa.

Ela acrescenta que a decisão mostra como a Justiça tem encontrado estratégias para enfrentar a ocultação patrimonial e reafirmar que a proteção dos filhos deve prevalecer sobre formalismos.

“Para as mulheres, representa mais equidade e justiça, pois assegura que a responsabilidade financeira seja realmente compartilhada de acordo com a capacidade de cada genitor e observando as necessidades do filho. Ao mesmo tempo, serve como parâmetro para outros julgadores e reforça a necessidade de um Direito das Famílias mais realista, socialmente comprometido e atento às desigualdades de gênero”, conclui.

Fonte : Site IBDFAM

STJ cria figura do “inventariante digital” para gerir dados de falecidos

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ decidiu, de forma inédita, pela criação da figura do “inventariante digital” em processos de inventário que envolvem bens armazenados em dispositivos eletrônicos de pessoas falecidas. A decisão foi tomada no julgamento do Recurso Especial 2.124.424, envolvendo a morte de seis membros de uma mesma família em acidente aéreo em São Paulo, em 2016. Os herdeiros buscavam acesso a três tablets pertencentes às vítimas para identificar eventuais bens digitais.

O “inventariante digital” terá a função de atuar como perito, acessando computadores, tablets e celulares com a finalidade exclusiva de identificar bens de valor econômico ou afetivo, sem expor informações íntimas ou protegidas pelo direito da personalidade.

Segundo a relatora, ministra Nancy Andrighi, a medida busca evitar que herdeiros, magistrados ou empresas de tecnologia tenham acesso irrestrito a dados altamente pessoais, como registros privados e comunicações protegidas por senha. “O inventariante digital apenas auxilia o juiz, com conhecimento técnico específico, a identificar quais bens podem ser transmitidos e quais devem permanecer sob sigilo”, destacou.

A relatora foi acompanhada pelos ministros Humberto Martins, Moura Ribeiro e Daniela Teixeira. Ficou vencido o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, para quem caberia ao próprio Judiciário autorizar o acesso às informações, sem necessidade da criação dessa figura intermediária.

A decisão é considerada um marco por inaugurar no Brasil a regulamentação judicial sobre a chamada herança digital, campo ainda sem disciplina legal específica.

REsp 2.124.424

Bens digitais

Em agosto deste ano, quando o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva pediu vista do processo, a relatora Nancy Andrighi já havia defendido a criação de um incidente processual de identificação de bens digitais.

Na ocasião, ela ressaltou que a abertura indiscriminada de dispositivos poderia expor informações íntimas e intransmissíveis. Sua proposta incluía a nomeação de um “inventariante digital” como auxiliar da Justiça, com dever de confidencialidade e responsabilidade civil e criminal em caso de violação.

O advogado e professor Marcos Ehrhardt Jr., vice-presidente da Comissão Nacional de Tecnologia do IBDFAM, avaliou que a futura decisão do STJ teria impacto significativo sobre o tratamento da herança digital no Brasil. “O papel do STJ é unificar a aplicação do Direito federal infraconstitucional em nosso país. Logo, um precedente que apresente uma solução para questões que ainda carecem de regulamentação contribui para conferir maior visibilidade ao assunto, fomentar o debate acadêmico e profissional sobre o tema e ainda ajuda a conferir um pouco mais de previsibilidade para futuras decisões judiciais relacionadas ao assunto”, afirmou na época.

Fonte: Site IBDFAM

Empresa é condenada por falha no repasse de pensão alimentícia a filhas de funcionário

Uma empresa foi condenada ao pagamento de indenização por danos morais após descumprir ordem judicial que determinava o desconto de pensão alimentícia diretamente na folha de pagamento de um de seus funcionários, pai de duas crianças. A decisão é da 5ª Vara Cível da Comarca de Santo André, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – TJSP.

A ação de  indenização por danos morais  foi ajuizada pelas filhas, representadas pela genitora, contra a empresa na qual o homem trabalha. O processo considerou o atraso reiterado no repasse de pensão alimentícia, que a empresa, na qualidade de empregadora do devedor de alimentos, deveria descontar em folha e transferir à conta indicada.

Conforme as autoras, a empresa cometeu sucessivos erros na efetivação da transferência, inclusive efetuando depósitos em conta incorreta, o que acarretou prejuízos às crianças, como a inadimplência de mensalidades escolares.

Ao avaliar o caso, a juíza reconheceu o descumprimento da obrigação legal da empresa de efetuar corretamente o repasse da pensão alimentícia. Segundo a magistrada, “trata-se de verba destinada à manutenção e ao sustento da família, de modo que os entraves observados por certo causaram danos passíveis de indenização”.

O valor da indenização foi fixado em R$ 5 mil para cada autora. Para o advogado Bruno Campos de Freitas, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, que atuou no caso, o valor “se mostra proporcional à gravidade da conduta e às consequências práticas enfrentadas”.

A decisão, segundo ele, reconhece a responsabilidade direta da empregadora que, ao ser incumbida judicialmente de fazer o repasse, falhou reiteradamente, mesmo após ser notificada formalmente sobre os dados corretos. “O reconhecimento de que terceiros responsáveis pela operacionalização dos pagamentos também podem responder por danos morais amplia a compreensão da responsabilidade civil nesse tipo de relação.”

O advogado acredita que a decisão pode servir como importante precedente para casos em que empresas ou instituições são encarregadas de cumprir determinações judiciais, como descontos e repasses, e agem com negligência.

“A decisão reforça o entendimento de que a obrigação judicial deve ser cumprida com diligência, sob pena de responsabilização por eventuais prejuízos, inclusive morais, especialmente quando envolvem verbas de natureza alimentar e menores de idade. Assim, tende a incentivar maior cuidado por parte dos empregadores e administradores ao executarem ordens judiciais”, conclui.

Fonte: Site IBDFAM

STJ mantém decisão que condenou pai a pagar indenização de R$ 150 mil por abandono afetivo

O Superior Tribunal de Justiça – STJ confirmou a condenação de um homem a pagar R$ 150 mil de indenização à filha por danos morais causados por abandono afetivo, após romper relações com ela desde o nascimento.

De acordo com o processo, na infância, a filha foi criada pela mãe, que morreu quando ela tinha 5 anos, quando passou a viver sob os cuidados dos avós maternos. Com a morte do avô e da avó, ela tentou se aproximar do pai, que a bloqueou nas redes sociais.

A sentença que fixou a indenização por abandono afetivo foi dada em segunda instância, pelo Tribunal de Justiça de Goiás – TJGO. A decisão destacou que a ausência intencional do pai durante toda a infância e juventude da filha, associada ao descumprimento de suas obrigações legais e materiais, configurou dano moral.

Segundo o acórdão, o dever de cuidado dos genitores é uma obrigação legal prevista na Constituição, no Código Civil e no Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, sendo independente de qualquer vínculo emocional.

O caso chegou ao Superior Tribunal de Justiça – STJ, que negou provimento ao recurso especial interposto pelo genitor por não atender aos requisitos de admissibilidade. Com isso, manteve-se a condenação fixada pelo Tribunal estadual goiano.

O processo tramitou em segredo de Justiça e a decisão transitou em julgado, não sendo mais passível de recurso.

Precedente 

O caso contou com atuação do advogado Charles Christian Alves Bicca, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM. Segundo ele, esta é a segunda maior indenização por abandono afetivo já reconhecida no Brasil e fica atrás apenas de um precedente do próprio STJ, de 2012, no valor de R$ 200 mil (REsp 1.159.242), citado pelo relator no TJGO como referência.

“A fundamentação destacou o artigo 229 da Constituição Federal, que impõe aos pais o dever de assistir, criar e educar os filhos menores. O descumprimento dessas obrigações configura ato ilícito indenizável. O desembargador relator também comparou a situação com casos de indenização por morte de pais e mães, afirmando que aquele que se esquiva totalmente da vida do filho também deve ser responsabilizado”, comenta.

O advogado ressalta que, apesar de inúmeras tentativas de aproximação, inclusive pelas redes sociais, o homem bloqueou qualquer contato e deixou claro que não queria vínculo com a filha.

“Em contrapartida, a jovem descobriu que uma irmã recebia tratamento totalmente distinto, com acesso a patrimônio bilionário, viagens internacionais e luxo, enquanto ela vivia em situação de pobreza”, conta.

No processo, foram anexados laudos técnicos que comprovaram sequelas emocionais graves decorrentes do abandono, como baixa autoestima, depressão, autorrejeição e traumas permanentes.

Patamar indenizatório

Charles Bicca acrescenta que a decisão tem impacto relevante porque retoma o patamar indenizatório de 2012, após mais de uma década, em que “condenações por abandono afetivo no Brasil raramente ultrapassam R$ 30 mil a R$ 40 mil”.

“Não se trata de um dano moral simples, que passa com o tempo. É um dano a um projeto de vida, permanente, que acompanha a vítima por toda a existência. O abandono é uma morte em vida. Por isso, precisa ser punido com máximo rigor”, afirma.

O advogado avalia ainda que a decisão tem caráter pedagógico e simbólico. “Nenhuma criança ou adolescente deve crescer sem o amparo mínimo de seus pais”, conclui.

Fonte: Site IBDFAM

Desigualdade de condições leva à fixação de alimentos diferentes para filhos de idosa de 94 anos

A 1ª Vara da Família e Sucessões da Comarca de São Paulo, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – TJSP, determinou que três dos quatro filhos de uma idosa de 94 anos contribuam proporcionalmente com pensão alimentícia em favor da mãe. A filha, que já presta cuidados diários à idosa, foi dispensada do pagamento.

A idosa ajuizou a ação contra os quatro filhos sob o argumento de que sua renda previdenciária, de aproximadamente R$ 5.800 não era suficiente para custear despesas mensais superiores a R$ 10.000, especialmente em razão de cuidados com saúde e contratação de cuidadores.

Com base nos critérios de proporcionalidade, possibilidade e necessidade, o magistrado fixou valores distintos para cada filho: um deve pagar um salário mínimo, o outro 50% do salário mínimo, e a outra filha 30% do salário mínimo nacional. A filha que cuida da autora ficou dispensada de pagar pensão em dinheiro, pois sua contribuição ocorre in natura, por meio da assistência direta.

O advogado Igor Florence Cintra, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, atuou no caso. Para ele, é “lamentável que uma questão como essa tenha chegado ao Judiciário”. 

Segundo o advogado, o dever de amparar os pais na velhice é expressão da solidariedade familiar, princípio que inspira o artigo 229 da Constituição Federal do Brasil.

“Mais do que uma imposição legal, trata-se de um compromisso ético, que deveria nascer da gratidão e do reconhecimento pelo cuidado recebido durante a infância e a vida adulta. A judicialização revela, de certo modo, uma ruptura desse elo de cuidado intergeracional, que é essencial para a dignidade da pessoa idosa”, comenta.

Solidariedade familiar

Na visão do advogado, a decisão da Justiça de São Paulo reforça a aplicação prática do dever de solidariedade familiar, previsto no artigo 229 da Constituição Federal e nos artigos 1.694 a 1.697 do Código Civil, “garantindo a proteção da pessoa idosa em situação de vulnerabilidade”.

A relevância, segundo ele, está na forma como a decisão harmoniza dois aspectos fundamentais: “o da dignidade da pessoa idosa, pois mesmo com renda própria, o idoso pode necessitar de complementação financeira para custear cuidados especiais; e, o da proporcionalidade entre necessidade e possibilidade, que distribui a obrigação alimentar de forma equilibrada, evitando onerar excessivamente apenas um descendente e valorizando a contribuição não financeira, como a prestação de cuidados diários”.

“A obrigação alimentar é solidária, mas não uniforme, podendo coexistir a pensão em dinheiro com o apoio pessoal prestado por uma das filhas”, explica.

Possibilidade

Igor destaca que a magistrada responsável pelo caso aplicou o critério previsto no artigo 1.694, § 1º do Código Civil, analisando criteriosamente a necessidade da mãe e as possibilidades individuais de cada filho.

De acordo com o advogado, a necessidade da alimentanda foi presumida pela idade avançada e comprovada pelos gastos com saúde e cuidadores. Quanto aos filhos, a contribuição foi definida conforme a capacidade econômica de cada um, individualmente, levando em conta renda, patrimônio e encargos familiares.

Além disso, acrescenta Igor, a filha com quem a genitora reside ficou dispensada de pagar valores, pois já cumpre sua obrigação com a assistência direta, “que também é forma de prestar alimentos”.

Ele conclui: “A sentença, portanto, é exemplo de aplicação concreta do trinômio proporcionalidade-necessidade-possibilidade, sem adotar soluções padronizadas e respeitando as peculiaridades do caso”.

Fonte: Site IBDFAM

Justiça do Rio Grande do Sul autoriza mãe a mudar de Estado e manter guarda compartilhada da filha

No Rio Grande do Sul, uma mãe obteve autorização da Justiça para levar sua filha de 6 anos ao mudar-se para Goiás. Apesar de ter a guarda compartilhada da criança com o pai, o lar de referência é o materno, por isso a 2ª Vara Cível da Comarca de Farroupilha acolheu o pedido de transferência.

Segundo a decisão, a mãe pediu a mudança para retornar à sua cidade natal, onde mantém laços familiares, após se divorciar do pai da criança e ficar desempregada. O pai se opôs, alegando a importância de preservar a rotina da filha, diagnosticada com Transtorno do Espectro Autista – TEA.

Ao analisar o caso, a Justiça gaúcha concluiu que a mudança de residência da mãe não prejudica a guarda compartilhada, já que o lar materno continua sendo a referência para a criança. Além disso, o juízo destacou que o pai, por exercer atividade em regime de home office, teria flexibilidade para reorganizar sua rotina e manter a convivência com a filha.

O juiz seguiu parecer do Ministério Público – MP, que se manifestou favorável à mudança e ressaltou que a criança mantém vínculos familiares em Goiás, onde moram os avós maternos. O MP também afirmou que os tratamentos médicos poderão ser readequados na nova residência e ressaltou a importância de cuidados para assegurar a adaptação escolar e clínica da menina.

Consequências

O caso contou com atuação da advogada Karla Felix, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM. Segundo ela, é comum que mães, com a guarda compartilhada de filhos e filhas, se mudem de cidade ou Estado sem autorização judicial, o que pode acarretar consequências sérias.

“Quando não há consenso entre os genitores, a mudança depende de autorização do Judiciário, sob pena de caracterizar violação de direitos ou até mesmo alienação parental”, explica. Ela alerta que, quando a alienação parental é reconhecida judicialmente, a guarda da criança pode ser transferida para o genitor alienado.

Por isso, para a advogada, a mãe do caso analisado adotou o caminho correto. “Ela recorreu à via legal e conseguiu uma decisão que garante tranquilidade, sem riscos jurídicos para si e para a guarda da filha”, diz.

A especialista destaca que a Justiça gaúcha analisou toda a situação e autorizou liminarmente que mãe e filha pudessem recomeçar a vida em um local próximo à rede de apoio familiar materna, com condições de estrutura e tratamento para a filha. “O melhor interesse da criança foi devidamente priorizado, pois uma decisão contrária beneficiaria apenas o interesse do genitor”, afirma.

Direito de convivência

Karla Felix ressalta que a decisão preserva a guarda compartilhada e o direito de convivência do pai, já que ele exerce trabalho remoto que permite flexibilidade para manter contato com a filha.

“A medida não rompe os laços com nenhum dos genitores e coloca em primeiro plano a necessidade de cuidado e proteção integral da criança”, pontua.

A advogada acrescenta que a decisão mostra que a guarda compartilhada não pode ser usada para impedir que a mãe retorne à cidade natal e que a criança mantenha convívio com os familiares maternos, desde que sejam adotadas medidas para minimizar eventuais impactos.

“É uma tendência do Judiciário de valorizar a guarda compartilhada como regra, sem que ela seja usada como obstáculo para reorganizações legítimas da vida dos genitores. Sendo assim, o melhor interesse da criança tem sido interpretado de forma ampla, considerando vínculos afetivos, acesso à saúde, educação e rede de apoio”, analisa.

Fonte: site IBDFAM

Mulher que se dedicou exclusivamente à família por 35 anos deve receber pensão permanente

No Rio de Janeiro, uma mulher que se dedicou exclusivamente à família na constância de uma união estável de 35 anos deverá receber pensão permanente do ex-companheiro. A 1ª Vara de Família da Comarca de Jacarepaguá converteu alimentos provisórios em definitivos e determinou o pagamento de 30% dos rendimentos brutos.

Conforme o processo, o casal manteve união estável por aproximadamente 35 anos. Neste período, tiveram três filhos e a autora se dedicou integralmente ao cuidado deles e do lar.

Na ação, a mulher, com mais de 60 anos, alegou ter renunciado a sua formação profissional e de qualquer atividade remunerada, enquanto o réu assumia sozinho o sustento da família.

Ao avaliar o caso, a juíza considerou que a situação financeira da autora dificulta sua inserção no mercado de trabalho. Além disso, conforme a magistrada, mesmo que venha a obter emprego, a renda provavelmente não seria suficiente para a subsistência digna, diante do tempo que ficou afastada da atividade profissional e da ausência de formação superior.

Ainda conforme a juíza, o réu, funcionário público aposentado, possui renda comprovada, o que possibilita o pagamento da pensão sem comprometer suas necessidades básicas.

Deste modo, e com base no princípio do binômio necessidade-possibilidade, a magistrada converteu os alimentos provisórios em definitivos, fixando o valor em 30% dos rendimentos brutos do réu, incluindo 13º salário, férias, abonos, verbas rescisórias e gratificações, a serem depositados diretamente em conta bancária da autora.

Necessidade

A advogada Mariana Diaz, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, que atuou no caso, destaca: “O fim da relação não rompe totalmente os laços de responsabilidade entre os ex-companheiros quando há dependência econômica consolidada”.

“Ao longo de uma relação tão prolongada, muitas vezes uma das partes se dedica mais à casa, à família, enquanto a outra se consolida no mercado de trabalho. Quando há desigualdade, como neste caso, no qual sempre existiu uma dependência econômica da ex-companheira, a lei e os Tribunais entendem justo garantir pensão para a parte mais vulnerável e hipossuficiente da relação”, comenta a advogada.

Segundo Mariana, o Judiciário tem interpretado o binômio com maior sensibilidade social em uniões estáveis longas. “A necessidade não se resume à sobrevivência mínima, mas também à preservação da dignidade de quem dedicou a vida ao casamento/união estável, equilibrada pela real possibilidade do ex-companheiro/ex cônjuge, de maneira mais humana e levando em conta o contexto da vida em comum desse casal.”

Fonte: Site IBDFAM