As cláusulas que limitam a responsabilidade da operadora de saúde, em relação a determinados exames e tratamentos, relacionando-as às resoluções editadas pela Agência Nacional de Saúde (ANS) ou qualquer outro critério semelhante, devem ser consideradas abusivas por oferecer restrições excessivas aos direitos do consumidor.
Com base nesse entendimento, a 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve, por unanimidade, a condenação de uma operadora de plano de saúde a custear um exame genético para uma criança com atraso global de desenvolvimento.
De acordo com a família, o exame é necessário para diagnosticar qual anomalia está causando o atraso cognitivo e motor na criança. O plano de saúde negou a cobertura com o argumento de que o exame não está incluído no rol de procedimentos da ANS. Porém, em primeiro e segundo graus, foi determinado que a operadora autorize o procedimento.
Segundo a relatora, desembargadora Ana Maria Baldy, nos termos da legislação consumerista, as cláusulas contratuais devem ser interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor, caracterizando-se abusivas aquelas que o coloquem em desvantagem exagerada ou que sejam incompatíveis com a boa-fé e a equidade.
“A abusividade, na espécie, consistiu em impedir que a parte apelada tivesse acesso ao exame mais moderno disponível no momento para investigação de possível deficiência intelectual, autismo ou anomalias congênitas, de causa desconhecida, o que permitirá identificar as alterações genéticas e fornecer um diagnóstico mais assertivo, e a autora poderá receber o cuidado mais adequado para o seu caso”, afirmou.
A magistrada também pontuou que o contrato deve se ajustar aos avanços da medicina, cabendo ao profissional da área a indicação do exame ou tratamento adequado ao seu paciente, não se admitindo interferência da seguradora para esse fim, sob pena de violar o próprio objeto contratado, isto é, a proteção da vida e da saúde do segurado.
“A Lei 14.454, de 21 de setembro de 2022, alterou a Lei 9.656/98, estabelecendo critérios que permitem a cobertura de exames ou tratamentos de saúde que não estão incluídos no rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar editados pela ANS”, acrescentou Baldy.
Conforme a relatora, o contrato de plano de saúde é por adesão, em que não é assegurada ao aderente, parte mais fraca, a discussão de suas cláusulas: “Assim, tais cláusulas devem ser interpretadas a favor da benefeciária aderente, para se evitar tratamento exageradamente desfavorável. E nem se diga que o acolhimento da pretensão inicial afrontaria o princípio contratual do pacta sunt servanda.”
Dessa forma, explicou Baldy, a exclusão do custeio do exame somente poderia ser acolhida se houvesse manifesto descompasso entre a possível doença verificada na criança e o atendimento proposto, o que não é o caso dos autos. Assim, ela considerou ilegal a negativa genérica de ausência de cobertura. “É abusiva a recusa realizada pela apelante, de sorte que o plano de saúde deverá custear o exame prescrito.”
Fonte: CONJUR
