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Operadora é condenada por reajustes abusivos de plano de saúde

A mensalidade de plano de saúde individual ou familiar pode sofrer reajuste por mudança de faixa etária, conforme estabelecido no Tema 952 do Superior Tribunal de Justiça. Esse aumento, porém, é condicionado à não aplicação de percentuais aleatórios que, sem base atuarial idônea, onerem excessivamente o consumidor ou discriminem o idoso.

Com base nesse entendimento, o juiz Paulo Henrique Ribeiro Garcia, da 1ª Vara Cível do Foro Regional de Pinheiros, em São Paulo, declarou a abusividade do reajuste imposto a uma beneficiária e condenou a seguradora a pagar a quantia atualizada de R$ 71,2 mil.

A consumidora contestou nos autos a aplicação de aumentos sobre o prêmio mensal, especificamente o reajuste por faixa etária (60 anos). Ela pediu o afastamento do aumento, a declaração de sua abusividade e a condenação do plano à restituição dos valores pagos a mais, além de indenização por danos morais.

A seguradora, em sua defesa, sustentou a regularidade dos aumentos, argumentando que eles estavam previstos em contrato e eram necessários para a manutenção do equilíbrio econômico da relação contratual.

Razoabilidade

O juiz destacou na decisão que o aumento de idade é um fator que altera o risco e, por isso, justifica a elevação da contraprestação mensal para se buscar o equilíbrio econômico do contrato. Assim, a cláusula que prevê o reajuste, em si, não é nula.

No entanto, para que o aumento seja válido em planos individuais ou familiares, é necessário que ele cumpra os requisitos estabelecidos pelo Tema 952 do STJ, que incluem previsão contratual, observância das normas regulamentadoras governamentais e aplicação de percentuais que não sejam desarrazoados ou discriminatórios contra o idoso.

A prova pericial produzida nos autos indicou que, de fato, os reajustes previstos na cláusula contratual para o intervalo de zero a 71 anos atendiam, em princípio, às disposições do STJ. O laudo atestou que os percentuais de aumento estavam justificados na ciência atuarial — cálculo dos riscos — e em consonância com as normas da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e da Superintendência de Seguros Privados (Susep).

Contudo, o perito identificou inconsistências no período revisional. Foi constatada a cobrança adicional de reajustes retroativos ao ano de 2004 — estabelecidos em um termo de ajuste e conduta (TAC) firmado com a seguradora.

Diante dessa irregularidade, o juiz concluiu que a cobrança praticada era abusiva. A seguradora foi condenada a devolver os valores excedentes pagos pela beneficiária, corrigidos monetariamente desde cada desembolso e acrescidos de juros.

Por outro lado, o julgador entendeu que o mero descumprimento de cláusula contratual ou a simples negativa de acordo não configuram, por si só, dano moral. A parte necessitava narrar e demonstrar transtornos graves, o que não foi verificado na petição inicial.

Processo 1008187-88.2016.8.26.0011

Fonte: Conjur.

Plano com três vidas é equiparado a familiar e deve seguir índices da ANS

Uma sentença da 6ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo reacendeu o debate sobre os planos “falsos coletivos” – contratos empresariais que, na prática, abrigam apenas um núcleo familiar.

O caso analisado pelo TJ/SP envolveu um plano da Bradesco Saúde S/A cuja mensalidade saltou de R$ 11 mil em 2020 para R$ 26 mil em 2025, um reajuste acumulado de 130,24%, valor quatro vezes superior ao limite fixado pela ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar no mesmo período.

A decisão reconheceu a natureza híbrida e atípica do contrato, determinando que o plano fosse equiparado à modalidade familiar, com aplicação dos índices oficiais da ANS e restituição dos valores pagos a maior.

O caso

A ação foi proposta por um microempreendedor e sua família, beneficiários de um plano coletivo com apenas três vidas (o titular, sua esposa e a filha), sem qualquer vínculo empregatício.

Os advogados, representantes dos autores, sustentaram que se tratava de “fraude estrutural de mercado”, em que operadoras mascaram contratos familiares sob a forma de coletivos empresariais para escapar da regulação pública.

Na petição, foi demonstrado que, caso os índices oficiais da ANS fossem aplicados, a mensalidade de 2025 não ultrapassaria R$ 14 mil, o que evidenciou uma cobrança 83% acima do valor permitido.

Fundamentos da decisão

Ao julgar o processo, a juíza reconheceu a inexistência de vínculo empresarial legítimo e destacou que tratava-se de uma demanda envolvendo contrato de seguro saúde coletivo com três vidas, todas do mesmo núcleo familiar. Diante de tais particularidades, não são aplicáveis as disposições legais ordinárias que regulam os contratos de plano de saúde empresarial coletivo.

A magistrada citou o art. 5º da RN 195/09 da ANS, que exige relação empregatícia ou estatutária entre a pessoa jurídica e os beneficiários, afastando a validade do enquadramento como plano empresarial.

Com base nisso, reconheceu a figura do “plano de saúde falso coletivo”, já consolidada na jurisprudência do STJ, e aplicou a lei 9.656/1998 e o CDC.

“Ainda que o contrato tenha denominação distinta (empresarial, coletivo etc.), o plano de saúde firmado deve ser interpretado à luz das normas aplicáveis aos contratos individuais e familiares, visto que se trata, em verdade, de contrato coletivo atípico, de natureza híbrida, reclamando a mesma proteção devida aos planos individuais.”

A sentença determinou, portanto, a aplicação dos índices de reajuste definidos pela ANS e a devolução simples dos valores pagos a maior nos últimos três anos, conforme o art. 206, §3º, IV, do CC.

Reajuste abusivo e vulnerabilidade do consumidor

A magistrada entendeu que os reajustes feitos pela Bradesco Saúde extrapolaram os limites da razoabilidade, violando o equilíbrio contratual. Por isso, determinou que fosse aplicado o índice de reajuste previsto pela ANS para planos individuais e familiares.

Além da limitação dos aumentos, a sentença determinou a atualização das quantias conforme o IPCA e a aplicação da nova sistemática de juros prevista na lei 14.905/24, que vincula o cálculo à diferença entre a taxa SELIC e o IPCA.

O julgado reafirma que, em contratos de saúde suplementar, a vulnerabilidade do consumidor deve prevalecer sobre a forma contratual, especialmente quando se trata de idosos, para quem aumentos sucessivos podem significar exclusão indireta do sistema privado.

Conclusão

A decisão paulista consolida o entendimento de que planos empresariais com poucas vidas – compostos por familiares sem vínculo empregatício – devem ser equiparados aos planos individuais/familiares, com todos os efeitos regulatórios e protetivos daí decorrentes.

Mais do que uma correção técnica, a sentença reafirma o papel do Judiciário como guardião do equilíbrio contratual e da dignidade da pessoa humana, princípios que permeiam a lei dos planos de saúde, o CDC e a Constituição Federal.

“Ante a vulnerabilidade concreta da parte autora segurada, incidem tanto as disposições protetivas aplicáveis aos planos de saúde individuais/familiares previstas na lei 9.656/1998, como também o CDC.”

Ao impor limites à prática dos “falsos coletivos”, o TJ/SP não apenas protege o consumidor, mas restabelece a função social do contrato de saúde – um instrumento que deve garantir acesso, e não exclusão.

Fonte: Site Migalhas