Tag: HERDEIRO

Plano deve manter filhos como dependentes após 25 anos de vínculo, decide Justiça de São Paulo

Uma operadora de plano de saúde deve manter dois filhos como dependentes no contrato firmado pelo pai, após 25 anos de vínculo ininterrupto. O entendimento unânime da  2ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – TJSP é de que a exigência tardia de comprovação econômica foi considerada abusiva por violar a boa-fé e a expectativa legítima de continuidade.

No caso dos autos, os filhos foram incluídos como dependentes no plano de saúde do pai em 1998. A operadora nunca exigiu qualquer comprovação de dependência econômica, até que, em 2023, comunicou ao titular que seus filhos deveriam apresentar documentos comprovando a dependência financeira para continuarem como beneficiários. Caso contrário, seriam excluídos do contrato.

Os beneficiários, por sua vez, argumentaram que o contrato não exige, de forma expressa, a apresentação de tal comprovação. A defesa é de que os filhos permaneceram no plano por 25 anos sem qualquer objeção da operadora, e que os pagamentos foram realizados regularmente durante todo esse período, o que reforçaria a legítima expectativa de continuidade do vínculo.

Na origem, o pedido foi parcialmente acolhido. O juízo de 1º grau determinou a manutenção apenas da cônjuge como dependente do titular, e autorizou a exclusão dos filhos. Os autores recorreram ao TJSP.

Ao avaliar o caso, o colegiado concluiu que a omissão prolongada da empresa em exigir comprovação de dependência econômica gerou expectativa legítima de permanência, caracterizando a supressio, situação em que o exercício tardio de um direito viola a confiança consolidada entre as partes.

A relatora destacou que os beneficiários figuram como dependentes no plano desde 1998 e que a operadora jamais exigiu prova de dependência econômica nesse período, mesmo após os filhos atingirem a maioridade e deixarem de se enquadrar nos critérios legais.

Segundo a relatora, ao aceitar por mais de duas décadas os pagamentos relativos aos dependentes sem qualquer questionamento, a operadora consolidou a expectativa legítima de que o vínculo seria mantido.

Assim, foi dado provimento ao recurso, reformando a sentença para determinar a manutenção dos filhos como dependentes no plano de saúde, nas mesmas condições anteriormente contratadas.

Processo: 1047569-34.2024.8.26.0100

Fonte: IBDFAM

STJ anula partilha antecipada em que divisão do patrimônio não foi igualitária

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ anulou a divisão de bens feita em vida por um casal que não havia dividido igualmente o patrimônio aos herdeiros. No caso, mais de R$ 700 mil foram destinados ao filho e R$ 39 mil para a filha.

Conforme o processo, os genitores firmaram escritura pública de partilha em vida dos bens que tinham. O documento deixava para a filha dois imóveis no valor de R$ 39 mil. Para o filho e a nora, R$ 711.486 em ações ordinárias nominais da empresa da família.

O colegiado considerou o artigo 2.018 do Código Civil e destacou que a partilha antecipada de bens só vale se pelo menos metade do patrimônio for distribuída igualmente entre os herdeiros necessários. Assim, atendeu ao recurso especial apresentado pela filha.

A autora havia vencido a ação na primeira instância, mas a sentença foi reformada pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina – TJSC.

A ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, destacou que, embora a legislação vigente não use mais a expressão “doação inoficiosa”, permanece o entendimento do Código Civil de 1916 que considerava ilegal a parte da doação que excedia “a legítima e mais a metade disponível”.

“A partilha em vida, portanto, deverá respeitar a legítima dos herdeiros necessários. Assim, apenas poderá dispor livremente o autor da herança de metade de seus bens, pois a outra metade pertencerá à herança legítima dos herdeiros necessários, por força do art. 1.721 CC/1916, melhor reproduzido no art.1.846 do CC/2002. (…) Assim, evidenciado excesso da doação pelos genitores, deve ser decretada a nulidade da parte que excede a que os doadores poderiam dispor no momento da liberalidade”, escreveu Nancy.

REsp 2.107.070

Patriarcado

Diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, o jurista Rolf Madaleno afirma que a decisão revela a enorme carga do patriarcalismo e o maior valor do julgado é a “realização da justiça”.

“Essa ideia de que os homens devem carregar as obrigações econômicas, administrar os bens e dar continuidade à administração patrimonial de uma família é um erro crasso, cometido por muitos pais que transferem seus bens, de forma clara ou velada, para os seus filhos varões. Esta decisão do STJ é pura e simplesmente a realização de um direito. Todos os filhos são iguais perante a lei”, comenta o especialista.

Rolf afirma que há inúmeros exemplos de partilhas desproporcionais, nas quais a maior parte dos bens são deixados para os filhos homens. Neste caso, ele afirma que a partilha feita em vida escancarou a disparidade, mas que, em geral, isso é feito de forma dissimulada. “É vergonhosa a forma como os homens protegem os filhos do mesmo sexo, seja simulando aquisições, comprando direto em nome dos filhos.”

“É como se as mulheres, na cabeça dessas pessoas ainda vinculadas ao patriarcalismo, fossem destinadas apenas aos cuidados da casa e coubesse aos maridos delas o sustento, de modo que elas não precisariam da herança dos pais”, avalia.

De acordo com o jurista, sempre que um filho ganha muito mais do que o outro, e não há uma equivalência na distribuição, é passível de anulação, pois afronta tanto a Constituição Federal quanto o Código Civil, segundo o qual todos os herdeiros devem ganhar o mesmo quinhão, “pelo menos da chamada porção indisponível”.

Fonte: site IBDFAM

TJSP relativiza o direito real de habitação para proteger herdeiro

O Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP decidiu que o direito real de habitação do cônjuge sobrevivente pode ser relativizado em caso de novas núpcias, afastando o entendimento expresso no artigo 1.831 do Código Civil. O acórdão reconhece o direito do herdeiro de pleitear aluguéis retroativos e a extinção do condomínio.

O caso é de uma ação de extinção de condomínio, na qual o imóvel foi deixado de herança pelo de cujus para a meeira e os dois filhos – irmãos apenas por parte de pai. A meeira não é a mãe do filho que moveu a ação.

Conforme consta nos autos, a outra filha continuou residindo no imóvel com a mãe que, posteriormente, constituiu novo matrimônio. O autor da ação pleiteou a extinção do condomínio com pedido de recebimento de aluguéis retroativos desde a notificação enviada no início da demanda.

A defesa alegou o direito real de habitação, expresso no artigo 1.831 do Código Civil. O juízo de origem acolheu a fundamentação e declarou improcedente a ação.

Na apelação, foi alegado o enriquecimento ilícito do novo cônjuge da meeira. O TJSP reverteu a sentença sob o entendimento de que, embora não seja expresso no artigo 1.831, as novas núpcias extinguem o direito real de habitação.

A decisão deu provimento ao recurso do autor para julgar procedente a ação principal, declarando a extinção do condomínio do imóvel, afastando o direito real de habitação da ré sobre ele. O autor também deverá receber o valor de R$ 250 mensais a título de aluguel do imóvel, enquanto durar a ocupação.

Código Civil

O caso contou com atuação do advogado Jorge Dias de Aguiar Neto, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM. Segundo o advogado, o entendimento do TJSP foi pela relativização do direito real de habitação em consonância com o Código Civil de 1916, em que pese a aparência absoluta expressa no Código atual.

Jorge explica que o artigo 1.831, do Código Civil 2002, não abre nenhuma exceção ao  direito real de habitação, ao contrário do expresso anteriormente no Código Civil de 1916: “Art. 1611, § 2º Ao cônjuge sobrevivente, casado sob regime da comunhão universal, enquanto viver e permanecer viúvo, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único bem daquela natureza a inventariar”.

O advogado conta que encaminhou sugestão para que a reforma do Código Civil incluísse no artigo 1.831 a extinção do direito real de habitação quando o cônjuge sobrevivente contraísse novas núpcias. “Mesmo que não seja alterado o citado artigo, o presente acórdão poderá servir como fundamentação em novos julgados”, afirma.

“Afinal, como sempre diz o Professor Rodrigo da Cunha Pereira, nossa missão é sempre aproximar o justo do legal e, neste caso, não há injustiça maior que um herdeiro se ver privado de um bem, que é seu legitimamente, mesmo após o cônjuge sobrevivente já estar casada(o) novamente e residindo neste imóvel com o(a) novo(a) parceiro(a)”, destaca o advogado.

Ele conclui: “Não à toa, a fundamentação da apelação foi o enriquecimento ilícito deste  novo cônjuge que, aproveitando-se do direito real de habitação do outro, ganha o direito de residir gratuitamente em imóvel alheio”.

Fonte: site IBDFAM