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TJ/SP autoriza filha a excluir sobrenome paterno por abandono afetivo

Para o Tribunal, a manutenção do sobrenome causava constrangimento e sofrimento psicológico à filha, o que justifica a retificação do registro civil.

Por unanimidade, a 2ª câmara de Direito Privado do TJ/SP autorizou a retificação do registro civil de uma mulher que solicitou a exclusão do sobrenome do pai, alegando abandono afetivo e material. 

Embora tenha mantido o indeferimento do pedido de desconstituição da filiação, o colegiado reconheceu o direito à supressão do patronímico paterno por entender que a permanência do nome causava constrangimento e sofrimento psicológico, circunstâncias consideradas suficientes para a alteração.

A filha ajuizou ação de desconstituição de filiação com retificação de registro civil pois alegou que foi vítima de abandono afetivo e material por parte do pai biológico e que, por isso, pretendia tanto retirar seu nome do campo de filiação quanto suprimir o sobrenome paterno de seus documentos oficiais.

O juízo da 1ª vara de Registros Públicos de São Paulo/SP julgou improcedentes os pedidos. Entendeu que não havia elementos que justificassem a desconstituição da filiação nem a alteração do registro civil, por ausência de erro ou falsidade no assento de nascimento.

Diante da decisão, a autora apelou ao TJ/SP reiterando que os fatos narrados configuravam justo motivo para a exclusão do sobrenome do pai, em razão do abandono vivenciado durante a infância e adolescência.

Sofrimento psíquico

Ao analisar o recurso, o relator, desembargador Giffoni Ferreira, reconheceu a impossibilidade de desconstituição da filiação, com base no artigo 1.604 do CC, que só admite alteração do estado de filiação em caso de erro ou falsidade, o que não se observou no caso concreto.

No entanto, destacou que é admitida a retirada do patronímico paterno quando comprovado o abandono afetivo e material, especialmente se a manutenção do sobrenome acarreta sofrimento psicológico aos filhos.

“A pretensão é admitida em casos de abandono afetivo e material pelo genitor, e quando a manutenção causa constrangimento e sofrimento psicológico, conforme jurisprudência do STJ. (…) No presente caso, tem-se que tais circunstâncias foram devidamente comprovadas, de modo que o acatamento desse pedido fora mesmo de rigor.”

Com base nesse entendimento, o colegiado reformou parcialmente a sentença para reconhecer o direito da apelante à exclusão do sobrenome do pai, determinando a expedição de mandado para retificação do registro civil.

A decisão foi unânime.

Processo: 1000199-64.2021.8.26.0100

Fonte: site Migalhas

Justiça de São Paulo reconhece validade de registro de união poliafetiva como contrato particular

A Justiça de São Paulo decidiu manter o registro lavrado em Cartório de Títulos e Documentos de uma união poliafetiva entre três homens. A decisão da 1ª Vara Cível de Bauru esclarece que, embora a legislação brasileira não reconheça a união poliafetiva como entidade familiar, nada impede que esse tipo de relação seja formalizado como contrato entre particulares.

O caso teve início quando os três companheiros registraram um termo de união estável poliafetiva. O registro foi feito por uma servidora do cartório, mas posteriormente questionado pelo oficial de Justiça, que instaurou procedimento administrativo, aplicou advertência à funcionária e suspendeu os efeitos do documento. Na Justiça, o oficial pediu o cancelamento definitivo do registro.

A sentença da Justiça paulista mostra que a Constituição Federal e o ordenamento jurídico brasileiros garantem aos particulares a liberdade de firmar negócios jurídicos que não sejam expressamente proibidos por lei. Assim, embora o Estado não reconheça esse tipo de união como uma entidade familiar – com os efeitos da união estável ou do casamento –, é possível o registro declaratório em cartório.

A decisão ressalta que o Provimento 37/2014, da Corregedoria Nacional de Justiça, também não impede esse tipo de registro. Além disso, reconhece o documento como um negócio jurídico de natureza privada, com efeitos restritos às partes, e nega o pedido do oficial de Justiça para o cancelamento do termo.

Entidade familiar

A registradora Márcia Fidelis Lima, presidente da Comissão Nacional de Registros Públicos do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, esclarece que a admissão do registro de contrato de união poliafetiva em Títulos e Documentos pelo TJSP não equivale ao reconhecimento dessa relação como entidade familiar, nos moldes da união estável ou do casamento.

Ela destaca, no entanto, que a medida representa um avanço significativo ao conferir publicidade e segurança jurídica ao pacto firmado entre as partes, o que possibilita a organização de direitos e deveres patrimoniais, como partilha de bens e divisão de despesas, com maior previsibilidade e eficácia perante terceiros.

“Em um cenário no qual o reconhecimento pleno como entidade familiar ainda não está consolidado – conforme, inclusive, as orientações administrativas do CNJ –, essa medida representa uma forma de o Direito salvaguardar a autonomia da vontade e a dignidade das pessoas envolvidas, mesmo que se limite à esfera contratual. É um reconhecimento pragmático da realidade social dos afetos múltiplos, sem forçar um enquadramento que ainda carece de maior amadurecimento no ordenamento jurídico”, afirma.

A especialista explica que o Provimento 37/2014, do CNJ, regulamenta o registro da união estável nos cartórios de registro civil, limitando-o à convivência “entre duas pessoas”. Nesse sentido, ele não autoriza o registro de uniões poliafetivas com efeitos de entidade familiar no Registro Civil de Pessoas Naturais – RCPN. No entanto, a decisão do TJSP interpreta que essa restrição se aplica especificamente aos efeitos familiares, e não ao Registro de Títulos e Documentos – RTD.

“O Tribunal argumenta, com base no artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal, que ‘ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei’. Como não há vedação legal expressa ao registro de instrumentos particulares declaratórios de união poliafetiva no RTD, as orientações administrativas não podem criar restrições não previstas em lei formal. Essa distinção se baseia na compreensão de que o RTD tem função meramente declaratória para dar publicidade a atos válidos entre as partes, sem constituir direitos de família ou estado civil, diferentemente do RCPN, que visa formalizar o reconhecimento documentando oficialmente estados civis”, afirma. 

Reconhecimento

A registradora acrescenta que o Provimento 37/2014 deve ser interpretado como uma norma que delimita o reconhecimento oficial de entidades familiares, e não como uma proibição absoluta ao registro de contratos privados. Segundo ela, é plenamente possível dar publicidade a acordos patrimoniais ou de convivência por meio do registro em Títulos e Documentos, desde que não se atribuam a esses contratos os efeitos jurídicos típicos de uma união estável reconhecida pelo Estado.

Sendo assim, ela entende que o principal limite da decisão judicial está na ausência dos efeitos típicos das entidades familiares legalmente reconhecidas, como o direito à pensão por morte, à herança legítima, à inclusão como dependente em planos de saúde ou à adoção conjunta de filhos.

“Ao restringir o reconhecimento à esfera contratual, o Estado não garante a essas relações os direitos constitucionais que decorrem da proteção à família, conforme previsto no artigo 226 da Constituição Federal, que reconhece a união estável entre homem e mulher, e, por extensão, a homoafetiva, sempre entre duas pessoas”, diz.

Segundo a especialista, essa realidade exige que os conviventes adotem uma postura mais cautelosa, organizando-se por meio de contratos que tratem de aspectos patrimoniais, sucessórios e de convivência. Para isso, recomenda recorrer a instrumentos como testamentos, procurações e contratos de coabitação, que formalizam os acordos entre as partes. Ela também destaca que o acompanhamento de advogados especializados pode ser essencial para garantir a validade e a segurança jurídica desses instrumentos.

E acrescenta: “Ainda que os limites sejam evidentes, a possibilidade de registro contratual já representa um avanço significativo, pois confere visibilidade e segurança jurídica a essas relações, retirando-as da total invisibilidade. É um reconhecimento da autonomia privada, da vida real e da liberdade de escolha, e um convite contínuo ao debate legislativo e doutrinário sobre a evolução das formas de família, que futuramente poderão levar a um reconhecimento mais amplo”.

Fonte: site Migalhas

Juízas reconhecem dano moral por traição e violência em ações de separação

Duas juízas da Paraíba reconheceram a existência de dano moral indenizável por traições e violência doméstica cometidas por homens contra suas ex-companheiras ao analisarem os processos de separação de dois casais.

Uma das mulheres será indenizada em R$ 50 mil por traição exposta nas redes sociais.

No primeiro caso, em uma ação de reconhecimento e dissolução de união estável, a 2ª Vara Regional de Família de Mangabeira (PB) condenou um aposentado a indenizar em R$ 30 mil a mulher com quem viveu por 30 anos por causa de violência doméstica praticada contra ela ao longo do relacionamento.

Segundo a mulher, ela foi vítima de agressões verbais e patrimoniais desde o início da relação. Ela relatou que o companheiro, por exemplo, jogava dinheiro em sua direção afirmando ser “esmola”. As agressões físicas começaram nos últimos anos da união.

A juíza Maria das Graças Fernandes Duarte levou em consideração a existência de um inquérito policial para apurar o crime e fotografias dos hematomas que o agressor teria causado na vítima. Em parecer sobre a investigação, o Ministério Público constatou indícios claros de violência física e psicológica.

“Desta feita, diante da gravidade da situação relatada, entendo cabível a condenação do promovido ao pagamento de indenização à autora a título de compensação moral pela violência doméstica sofrida durante os anos de união”, concluiu a julgadora.

No segundo caso, a 4ª Vara de Família de João Pessoa reconheceu o dano moral causado por um caso extraconjugal. O juízo chegou ao entendimento ao julgar uma ação de divórcio litigioso movida pela mulher traída.

A autora relatou que seu CPF foi usado pelo ex-companheiro para a compra de um ingresso de Carnaval que foi dado a uma amante. Os dois foram fotografados juntos na festa e as imagens foram publicadas em redes sociais.

Para a juíza Maria das Graças Fernandes Duarte, o incômodo causado pela traição, por si só, não configura dano indenizável. A divulgação das fotos da infidelidade, porém, atingiu a imagem da mulher traída e adequa o caso ao artigo 186 do Código Civil (Lei 10.406/2002).

“A infidelidade conjugal, não obstante a dor íntima e os transtornos que possam causar à pessoa traída, não configura, por si só, ato ilícito apto a ensejar indenização por dano moral, ressalvadas as situações extremas de exposição do consorte enganado a vexame social, a constrangimento ou a humilhações sociais, propalação de fato e sua repercussão no meio social e familiar, afronta à dignidade da pessoa humana, ocasionando profundo desgosto, situações que se acham evidenciadas no caso em comento”, escreveu a magistrada.

“Nesse diapasão, o valor da indenização deve ser fixado considerando-se a extensão da lesão sofrida, a condição financeira do réu e o caráter pedagógico, e nesse cenário entende-se por razoável o valor de R$ 50 mil a título de indenização a ser pago pelo promovido, em favor da sua ex-esposa, levando-se em consideração as razões acima explicitadas.”

A advogada Nevita Luna representou as duas mulheres. Ela afirmou que “as sentenças têm gerado repercussão por trazerem um olhar sensível e reparador, com perspectiva de gênero e valorização do trabalho invisível das mulheres”.

Site: Conjur