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TJPR reconhece dupla maternidade em caso de inseminação caseira

A 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná – TJPR reconheceu a dupla maternidade de um casal de mulheres cujo filho foi gerado por meio de inseminação caseira. O entendimento é de que é possível aplicar analogicamente o artigo 1.597, inc. V, do Código Civil, como forma de conferir a máxima efetividade aos direitos humanos reprodutivos e sexuais das pessoas LGBTQIAPN+.

As mulheres optaram pela inseminação artificial caseira em razão da impossibilidade de custear o procedimento de reprodução assistida em uma clínica especializada. A técnica foi bem-sucedida e uma delas deu à luz a gêmeos em outubro de 2023.

O casal ajuizou a ação em busca do reconhecimento da maternidade da mãe não gestante, com a inclusão do nome na certidão de nascimento das crianças. Ao garantir o registro, o TJPR destacou a importância de considerar o contexto social e as múltiplas vulnerabilidades enfrentadas por famílias não heteronormativas.

A decisão também menciona a necessidade de evitar discriminações indiretas e de garantir a máxima proteção dos direitos humanos sexuais e reprodutivos da população LGBTQIAPN+.

O colegiado reconheceu a ausência de regulamentação específica sobre a inseminação artificial caseira na legislação brasileira, mas destacou: isso não torna a técnica ilícita.

Jurisprudência

O desembargador Eduardo Cambi, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, observa que diversos casos de inseminação caseira de casais homoafetivos têm chegado ao TJPR após o julgamento da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ, no qual foi reconhecida a presunção de maternidade de uma mãe não biológica em caso de inseminação artificial caseira realizada no contexto de união estável homoafetiva.

O IBDFAM atuou como amicus curiae no julgamento. Relembre aqui. (REsp 2137415 – SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 15/10/2024, DJe de 16/10/2024).

“Embora as técnicas de fertilização in vitro sejam da década de 1970 , o artigo 1.597, inciso V, do Código Civil de 2002 foi pensado para contemplar apenas a situação de mulheres inseridas em  casamentos heterossexuais. A interpretação do STJ, seguida pelo TJPR, fortalece a concepção pluralista de família consagrada pelo STF na ADI 4.277 e ADPF 132”, avalia o desembargador.

Segundo ele, a interpretação confere segurança jurídica aos casais homoafetivos que, ao se submeterem à inseminação artificial, pretendem registrar a paternidade ou a maternidade. Além disso, a decisão considera a situação social e econômica de casais pobres que recorrem à inseminação caseira para terem seus filhos, por não terem acesso  aos recursos necessários para arcar com os custos das clínicas de fertilização.

“Inúmeras violações de  direitos humanos ocorrem em razão da hierarquização entre o ‘eu’ e o ‘outro’. Discriminar o outro, porque é diferente de mim, é rejeitar as diferenças. As injustiças nascem da falta de tolerância com o diferente”, acrescenta.

Eduardo Cambi ressalta que o Direito das Famílias, no contexto do Estado Democrático de Direito, deve assegurar a coexistência digna, os projetos de vida compatíveis com os valores éticos da Constituição Federal e a igualdade substancial entre todas as pessoas.

As lacunas legislativas, acrescenta o especialista, não podem impedir as pessoas de viverem seus afetos e buscarem ser felizes. “Se o exercício da liberdade e da autonomia privada são legítimos, não pode o Estado violar esses direitos humanos.”

Teoria da causa madura

De acordo com o desembargador, uma das maiores críticas à atuação do Poder Judiciário é a morosidade processual, e o Código de Processo Civil de 2015, em sintonia com a Emenda Constitucional 45/2004, assegurou a garantia da duração razoável do processo.

Uma das formas de promover a celeridade da prestação jurisdicional, segundo ele, é aplicar a teoria da causa madura, prevista no artigo 1.013, § 3º, do CPC.  “No caso concreto, o juiz havia resolvido o processo sem julgamento de mérito, por entender que a pretensão de registro duplo de maternidade na hipótese de inseminação caseira é vedada pelo ordenamento jurídico.”

“A questão é puramente de direito. Os fatos eram incontroversos. O TJPR conferiu tratamento jurídico diferente da sentença apelada e, sem a necessidade de fazer o processo retornar à primeira instância, conferiu à tutela jurisdicional”, afirma.

Proteção

De acordo com o desembargador, a população LGBTQIAPN+ é a que mais sofre pela ausência de proteção jurídica. “Não há tratados internacionais nem legislação interna suficiente para reconhecer e proteger, de forma adequada e eficiente, os direitos humanos das pessoas LGBTQIAPN+.”

Nesse sentido, ele considera decisões como a do TJPR importantes “não apenas para afirmar os direitos reprodutivos e sexuais, mas principalmente para fixar ‘standards’ éticos de justiça coexistencial”.

“A preocupação com a justiça reprodutiva transcende a mera proteção dos direitos sexuais e reprodutivos para abranger o exame do contexto social, econômico e de políticas públicas que afetam de forma desproporcional a capacidade – especialmente das mulheres e de pessoas LGBTQIAPN+ – em tomar decisões informadas e autônomas sobre seus corpos”, conclui.

Fonte: site IBDFAM

Justiça da Paraíba garante registro de dupla maternidade em caso de inseminação caseira

A Justiça da Paraíba reconheceu o direito de um casal homoafetivo de registrar o filho concebido por meio de inseminação caseira. Juntas há quatro anos, as duas mulheres obtiveram o direito após ação movida pela Defensoria Pública do Estado, que buscou garantir o reconhecimento da união estável entre elas e a inclusão do nome de ambas na certidão de nascimento da criança.

A Justiça reconheceu a ação da Defensoria Pública, e julgou procedente o pedido do casal, determinando que assim que a criança nascesse, fosse-lhe fornecido o direito à dignidade, e o nome das mães no registro civil.

No Brasil, o registro de dupla maternidade em casos de inseminação caseira ainda enfrenta desafios devido à ausência de regulamentação específica. Atualmente, o procedimento é tratado de forma desigual, dependendo da interpretação de cada cartório ou decisão judicial. Apesar de avanços importantes, como decisões do Superior Tribunal de Justiça – STJ, que garantiram o registro nesses casos, não há uma norma geral que assegure esse direito de maneira uniforme.

A legislação vigente prevê a comprovação do procedimento em clínicas autorizadas. Casais que utilizam a inseminação caseira frequentemente precisam recorrer ao Judiciário para obter o reconhecimento da dupla maternidade.

O tema está em debate no Conselho Nacional de Justiça – CNJ, onde o Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM apresentou pedido de providências para regulamentar a situação. 

Regulamentação

A jurista Maria Berenice Dias, vice-presidente do IBDFAM, afirma que a reprodução humana assistida é regulamentada de maneira superficial na lei brasileira.

Ela explica que a reprodução assistida segue critérios definidos pelo Conselho Federal de Medicina – CFM, que regulamenta procedimentos como inseminação artificial e fertilização in vitro. Para o registro de criança gerada por reprodução assistida, o órgão exige a apresentação de declaração do diretor técnico da clínica para atestar que o procedimento ocorreu sob supervisão médica e seguindo normas éticas.

“Essa exigência, de maneira absolutamente equivocada, acabou sendo adotada pelo CNJ que, ao regulamentar o registro das crianças nascidas por inseminação artificial, passou a exigir o mesmo documento, ou seja, o documento firmado entre médico e paciente, para ser feito o registro civil”, destaca.

Maria Berenice Dias avalia os impactos desta exigência nos casos de autoinseminação, popularmente conhecida como inseminação caseira, nos quais não há a documentação exigida pelo CNJ: o registro civil é negado e as famílias precisam recorrer ao Judiciário. “A solução, para não deixar essas crianças sem registro, é bater nas portas do Judiciário, aumentar barbaramente o número de processos, que não precisam estar na Justiça, para pedir a autorização do registro, e é o que a Justiça tem feito.”

“A postura do IBDFAM, desde o primeiro momento, foi requerer ao CNJ a retirada da exigência nas hipóteses de inseminação caseira. O pedido foi negado com base no parecer do CFM, mas fato é que não é possível que o Estado negue que essas crianças tenham direito à cidadania desde quando nascem”, esclarece a especialista.

Segundo a vice-presidente do IBDFAM, após a decisão do Superior Tribunal de Justiça – STJ, na qual a ministra Nancy afirmou que não se pode exigir o documento para o registro (REsp 2.137.415/SP), o IBDFAM voltou a requerer a regulamentação pelo CNJ de forma específica em casos de inseminação caseira. “Enquanto isso não acontece, a Justiça continua a atender essas demandas.”

“O movimento do IBDFAM é para que os direitos sejam exercidos. Para que o direito à identidade, o direito à cidadania seja garantido pelo Estado a partir do momento que a criança nasce”, conclui.

Fonte: site IBDFAM

Homem trans tem paternidade reconhecida em caso de inseminação artificial caseira

A 2ª Vara da Família e Sucessões de São Vicente, em São Paulo, reconheceu a paternidade de um homem trans em um caso que envolveu inseminação artificial caseira. A decisão garantiu a inclusão dos nomes do genitor e dos avós paternos no registro de nascimento da criança.

Após o pedido de registro ter sido negado pelo Cartório de Registro Civil, a Defensoria Pública ajuizou uma ação declaratória, fundamentada na presunção legal do artigo 1.597, V, do Código Civil, que reconhece como filhos do casamento aqueles concebidos por inseminação artificial heteróloga.

Também foi ressaltado que o Provimento 63/2017 do CNJ autoriza o registro extrajudicial de filhos havidos por reprodução assistida, abrangendo casais homoafetivos e heteroafetivos, sem a necessidade de autorização judicial.

A decisão da 2ª Vara da Família e Sucessões de São Vicente considerou estudos psicológicos que comprovaram o vínculo socioafetivo entre o pai e a criança, e o parecer favorável do Ministério Público. Segundo a juíza responsável pelo caso,  “a situação fática já consolidada e benéfica à criança deve ser prontamente reconhecida e o afeto reconhecido, honrado e tutelado”.

Assim, foram acolhidos integralmente os pedidos da Defensoria Pública, determinando a inclusão do nome do pai no registro de nascimento da criança, bem como os nomes dos avós paternos.

Fonte: site IBDFAM